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Para os painelistas, a internet democratiza espaço para a crítica

Para os painelistas, a internet democratiza espaço para a crítica

ANA PAULA APRATO/JC

Economista Raul Velloso ressaltou potencialidades do uso da web.
Economista Raul Velloso ressaltou potencialidades do uso da web.

A internet facilita a distribuição de informações ao mesmo tempo que abre espaços para a contestação. Dessa maneira, acaba também por ampliar a responsabilidade dos veículos de comunicação sobre a cobertura dos fatos, os deixando mais sujeitos da crítica do público, que encontra nas redes sociais espaço de reverberação de suas opiniões. Esse cenário foi descrito ao longo de diversas palestras do 24º Fórum da Liberdade, encerrado ontem na Pucrs, em Porto Alegre.

Ao justificar a afirmação de que o corte de R$ 50 bilhões no orçamento, anunciado pelo governo federal em fevereiro, era fictício, o economista Raul Velloso sustentou seu ponto de vista positivo em relação à internet: "O mesmo governo que mente me dá, pela rede, condições de dizer que ele mentiu". Ele usou dados do próprio governo para demonstrar aos participantes que, entre 2010 e 2011, as despesas primárias passaram de R$ 657 bilhões para R$ 719 bilhões. Ou seja, segundo o palestrante, a redução de R$ 50 bilhões afetou apenas a previsão orçamentária.

"Pelo menos no Piauí, onde eu nasci, passar de R$ 657 bilhões para R$ 719 bilhões de um ano para outro significa aumento da despesa", afirmou, provocando aplausos da plateia. Ele detalhou, ainda, que 74,1% do orçamento da União estão vinculados aos programas de transferência de renda (48,8%) e pagamento de pessoal (25,3%). "Um modelo que tende a perpetuar no poder quem faz essa gestão", disse.

O lado menos libertário da internet foi apontado pelo economista Rodrigo Constantino, que, citando o livro The Net Delusion, de Evgeny Morozov, apontou que os governos "inimigos da liberdade" aprendem logo a usar as ferramentas da internet "que o Ocidente quer acreditar que têm poder de subverter os sistemas ditatoriais". "Hugo Chávez usa o Twitter", lembrou.

Para Constantino, as expectativas sobre a internet parecem infladas. "O Twitter e o Facebook não põem fuzis nas mãos das pessoas. Mas a Irmandade Islâmica aprendeu a usar a rede. E eles são perigosos. O que importa não é a ferramenta, mas a mensagem que se transmite com ela. A tecnologia não tem nenhuma ideologia", reforçou Constantino.

Essa situação se reflete também na imprensa. Com um apanhado de diferentes teorias, desde autores clássicos a acadêmicos contemporâneos, o jornalista Merval Pereira, do Rio de Janeiro, sintetizou a ideia de interdependência entre as novas mídias e os canais tradicionais da imprensa, além de sua função fiscalizadora do Estado. De acordo com Pereira, a internet nada mais é que uma caixa de ressonância dos grandes veículos de comunicação, que continuam a ter o conteúdo mais lido na web. "O papel da imprensa é cada vez mais importante para garantir a democracia", disse.

Pereira – que não acredita na extinção dos meios tradicionais, como jornais e revistas – lembrou ainda que o Brasil, apesar das ameaças de regulação, é uma exceção na América Latina, onde a censura está presente. É o caso da Venezuela, que foi apresentado pelo presidente da rede venezuelana Globovisión, Guillermo Zuloaga.

Segundo o executivo, a relação do governo de Hugo Chávez com a imprensa é marcada por conflitos, criação de leis restritivas à liberdade de expressão, prisões e fechamento de meios de comunicação independentes. "A lei permite que meios não difundam mensagens de terceiros consideradas ofensivas pelo governo", exemplificou. Zuloaga afirma que ao mesmo tempo que o governo firma sua hegemonia na imprensa local, continua cerceando os meios livres e independentes.

Interatividade coloca direitos autorais em debate

As formas como as pessoas se comportam na internet e encaram o direito autoral também foram debatidas na Pucrs. O doutor em Direito Civil Carlos Affonso de Souza iniciou o debate sobre inovação e tendências mostrando as mudanças que a rede mundial de computadores provocou no acesso aos bens culturais, na interatividade e na colaboração entre os indivíduos, enquanto o publicitário Rony Rodrigues abordou as diferentes formas como cada geração encara a liberdade.

Segundo Souza, a interatividade passou de restrita a ampla, a colaboração foi de nula a plural e a interação passou a ser estimulada, o que transformou a viabilidade econômica da produção cultural em uma questão central. "Hoje todos esperam que o conteúdo seja gratuito."

Este debate, aberto há 11 anos pelo Napster, provocou a criação de travas jurídicas e tecnológicas para a compra de músicas, mas ainda não proporcionou a formatação de um modelo capaz de garantir o respeito aos direitos autorais. Para ele, é preciso que o uso da rede e a legislação se aproximem e iniciativas como a ferramenta Creative Common (que permite apontar quais usos estão autorizados para o material que está na internet) podem ser um bom começo.

Já Rodrigues lembrou que a geração atual, a chamada geração Y, é a primeira a dominar códigos globais e atribui à internet, que ele chama de "chave do mundo", o mesmo poder libertador atribuído pela geração X à chave do quarto (individualidade) e pela geração baby-boom à chave de casa, o direito de ir e vir.

Tecnologia transforma a educação

A educação do futuro também esteve no rol de temas debatidos no Fórum da Liberdade. A entrada da internet no cotidiano de mestres e aprendizes é fator determinante para pensar novos moldes educacionais. O CEO da Anhanguera Educacional, Alex Dias, aposta na humanização da tecnologia para inserção massiva no ambiente escolar. Com isso, dá exemplos práticos de ações que já vêm sendo desenvolvidas e inspiram o que pode se tornar a parceria entre educação e tecnologia no Brasil.

Através de jogos e iniciativas que contemplam tanto a curiosidade dos alunos quanto a autoridade dos professores, bons resultados podem ser alcançados. Com diferentes plataformas, Dias afirma que o conhecimento pode ser carregado junto com os estudantes.

Já o presidente da IBM no Brasil, Ricardo Pelegrini, destaca a necessidade de olhar a educação para que ela esteja de acordo com as necessidades do mercado. Segundo o executivo, a simples inserção de disciplinas técnicas no currículo escolar e universitário já traria mudanças significativas.

Tas e Madureira destacam espaço para o indivíduo

O painel de encerramento do 24º Fórum da Liberdade, Uma Nova Democracia Digital, levou os humoristas Marcelo Tas e Marcelo Madureira a tratar da importância da participação individual na internet. Na avaliação dos debatedores, a liberdade na era digital é pautada pelos próprios consumidores. Tas ressaltou a importância das redes sociais como ferramentas de feedback às empresas. Já Madureira questionou a produção de conteúdo grátis fornecido pelos usuários das redes sociais, o que resulta em um "vazio intelectual". Os debatedores ainda criticaram a falta de protagonismo da população diante da regulamentação.

Rede é terreno fértil para comércio

Metáforas sobre o funcionamento do mercado e exaltação do posicionamento do Brasil no uso da internet marcaram o painel que abordou a livre economia na web. O presidente da Foundation for Economic Education (FEE), Lawrence Reed, apontou que o Brasil precisa ganhar em termos de liberdades, tanto no que se refere ao comércio tradicional quanto na web. De acordo com ele, o protecionismo do governo brasileiro é negativo, equivalente a um ataque ao livre comércio, válido também para a internet.

Já o economista norte-americano Tyler Cowen apresentou um panorama mais otimista sobre as possibilidades que a internet oferece ao mercado brasileiro. Lembrando o interesse do País em redes sociais como o Twitter e Facebook, Cowen sugeriu que a web é o canal de mais difícil regulação e tributação.