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Como o Brasil lida com a veiculação do primeiro beijo gay em rede nacional?

A presença do vídeo acima, com a cena do primeiro beijo gay em rede aberta de televisão no Brasil, não é à toa. Certamente, antes de ler esta matéria, nossos leitores serão tentados a ver o trecho da novela do SBT, Amor e Revolução, exibido nesta quinta-feira (13). Porém, nossa intenção é a de debater porque no Brasil este tipo de apelo funciona a ponto de a emissora ter alcançado uma marca inédita de audiência no dia em que veiculou duas mulheres se beijando.

As personagens Marcela (Luciana Vendramini) e Marina (Giselle Tigre) protagonizaram a cena histórica que fez com que a emissora alcançasse pela primeira vez a Record no Ibope. Mas não foi apenas isso, o assunto repercutiu nas redes sociais e chegou aos TT’s do twitter, a lista dos assuntos mais comentados.

A postura do SBT foi elogiada e criticada por diversos setores da sociedade.

O fato é que o Brasil agora experimentou pela primeira vez o beijo gay em um espaço público de grande audiência. Diferentemente da Globo, por exemplo, que por inúmeras vezes ensaiou a divulgação de uma cena de beijo gay, o SBT entrou para a história como a emissora que realizou este feito. “Foi na verdade um grande negócio”, avaliou o professor do curso de pós-graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), Fernando Seffner.

Para o professor, que realiza pesquisas na área da sexualidade, a audiência e repercussão da cena só se propagou em razão de aspectos culturais da sociedade brasileira. “Na Argentina o beijo gay não teve todo este alarde. O que acontece é que, no Brasil, tudo que está relacionado a sexualidade é supervalorizado. A polêmica e a audiência são o reflexo da nossa identidade”, disse. E exemplifica: “Aqui as propagandas que mais pegam são as com conteúdos apelativos. Na Alemanha jamais uma cerveja se chamaria Devassa. Nos EUA, uma estagiária quase derrubou um presidente americano. Aqui, o José de Alencar (vice-presidente falecido em março) morreu sem reconhecer uma filha e quase foi santificado”, comparou.

Moral da Família x Moral do Espaço Público

O gaúcho Fernando Seffner também analisa outro aspecto relacionado ao comportamento da sociedade brasileira diante da veiculação de cenas de afeto com pessoas do mesmo sexo. Ele considera que é preciso esclarecer a diferença entre o que é permitido fazer nos espaços públicos (igrejas,emissoras, escolas) e na vida privada das famílias. “O espaço público é o espaço da tolerância com a diversidade, estes espaços não podem ser impositores de moral. É necessário olhar o espaço público com a consciência de que nestes ambientes será dito ou feito coisas que talvez nossas famílias não aprovem. Mas é necessário respeito”, defende.

Para o presidente da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transsexuais (ABGLT), Toni Reis, o beijo não atinge em nada a vida das famílias brasileiras. “Nada mudou hoje. Todos estão convivendo normalmente, indo para escola, fazendo suas coisas”, disse sobre a aprovação da entidade sobre a cena. Ele apenas questiona a legislação brasileira que permite exibição de cenas afetivas entre pessoas do mesmo sexo, mas, ao mesmo tempo, não aprova um projeto para criminalizar quem age com preconceito com os homossexuais. “Nós estamos em negociação com o Ministério da Justiça inclusive sobre o questionamento que fizemos à rede Globo, pela justificativa de que nunca veicularam o beijo gay que anunciaram por ser fora do horário permitido”, falou.

Classificação indicativa

O debate sobre a classificação indicativa reacendeu no final de 2010, quando o Ministério da Justiça chamou entidades para discutir sobre suas regras e abriu espaço para as contribuições até abril de 2011. Segundo o explicado pela Secretaria Nacional de Justiça, a classificação indicativa não promove censura, apenas recomenda faixas etárias e, no caso da televisão, estabelece horários recomendados para determinadas faixas etárias. Os beijos entre pessoas do mesmo sexo é tratado pela classificação indicativa da mesma forma que um beijo entre heterossexuais, ou seja, não podem os órgãos emissores do conteúdo promover a discriminação em suas classificações indicativas.

“Até agora não recebemos resposta”, critica o presidente da Associação Brasileira de Lésbicas,Gays,Bissexuais,Travestis e Transsexuais (ABGLT), Toni Reis.

Na avaliação do professor do curso de pós-graduação em Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), Fernando Seffner, “a diferença em faixas etárias é para a família ter o controle sobre o que permitirá aos filhos assistirem. É uma informação para os que assistem televisão, o que hoje é defasado, já que existem muitos conteúdos na internet e as crianças dormem cada vez mais tarde”, disse.

Segundo ele, a questão que mais influencia a veiculação ou não de cenas como a que exibiu o SBT é seguir a lógica de mercado, já que existe uma legislação que não faz diferença por opção sexual. “Como não temos disposição ou normativa que diferencie o beijo heterossexual ou homossexual, o que vale é a audiência, o mercado, a negociação. As emissoras, os políticos e todos nós, quando vamos para o espaço público, buscamos agradar a maioria. Isso explica porque a justiça decidiu por unanimidade o que Congresso Nacional não consegue”, falou. E comparou: “O código moral da televisão está também vinculado ao interesse do público. É o jogo do custo-benefício”. sul-21