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Pseudofelicidade: especialista cobra melhoria para atendimento dos que sofrem de transtorno bipolar

Agência Brasil

Brasília – A saúde pública brasileira pode ser considerada um exemplo da necessidade de o Estado investir mais no Sistema Único de Saúde (SUS) e nas universidades federais e estaduais para garantir uma das necessidades básicas do cidadão e assim que ele busque sua felicidade. A especialista em transtornos afetivos e coordenadora do laboratório de psiquiatria da Universidade de Brasília (UnB), Maria das Graças de Oliveira, destacou que a rede pública enfrenta um quadro “caótico”, o que inviabiliza, por exemplo, o tratamento de cerca de 12,4 milhões de pessoas com uma doença conhecida como transtorno bipolar.

Esse transtorno afetivo é caracterizado por uma oscilação brusca de humor, quando passam por momentos de “pseudofelicidade” ou euforia, para logo depois entrar em depressão. A psiquiatra disse que do total de pessoas com transtorno bipolar, 1,8 milhão sofre do tipo 1 da doença, o estágio mais grave.

“Na verdade, nem os serviços públicos nem os serviços privados tem capacidade de atender a um contingente desses. Não tem serviços de saúde mental para todo mundo”, ressaltou a médica.

Maria das Graças acrescentou que a maioria dos brasileiros, principalmente os mais pobres, portadores do transtorno bipolar não contam com atendimento ambulatorial e, muito menos, psicoterapia. Para dar essa oportunidade de atendimento pelo SUS, seria necessário investimentos maciços nos hospitais públicos e universitários, especialmente em equipamentos de alto custo no mercado.

A coordenadora do Laboratório de Psiquiatria da UnB cobrou das próprias universidades públicas a responsabilidade por pesquisas de desenvolvimento de tecnologias que permitam “abordagens psicossociais” mais viáveis economicamente para atender um número maior de pacientes bipolares que vivem momentos de uma “felicidade artificial”. “É óbvio que a indústria farmacêutica não vai fazer isso, ela vai pesquisar medicamentos. Quem tem que pesquisar [isso] somos nós da universidade. Eu diria que temos o dever ético de fazê-lo”.

Pesquisas científicas demonstram que essa doença, que oscila entre momentos de euforia e depressão, geralmente é diagnosticada com mais precisão entre os 18 e 25 anos. Segundo ela, estudos mais recentes mostram que, em muitos casos, os portadores da bipolaridade já apresentam os sintomas de um humor patológico desde a infância.

Essa pseudofelicidade, no caso do transtorno bipolar, é caracterizada por estados de impulsividade, arrogância, pensamento acelerado, fala rápida e com atropelo de palavras sem permitir a terceiros participarem da conversa, pouco período de sono e, o mais grave, atos de inconsequência que lhe trazem repercussões negativas a curto prazo.

Maria das Graças aposta nas trocas de experiências entre as pessoas com bipolaridade, pela formação de grupos de apoio, criando uma “rede de proteção”, em que a pessoa e seus familiares se sintam acolhidos. Ela foi uma das responsáveis por viabilizar, em 1999, a Associação Brasileira de Familiares Amigos e Portadores de Transtornos Afetivos (Abrata) que atua no Hospital das Clínicas de São Paulo.

“O motivo é sentir que você não está sozinho no mundo. Isso já é muito bom. Já tem, psicologicamente um efeito de proteção coletiva”, disse a psiquiatra. Ela acrescentou que o grupo funciona como uma forma de o paciente aprender a lidar melhor com a doença, a partir das experiências de outra pessoa.

Um grupo parecido atua a cerca de dois anos em Brasília, é o Núcleo de Mútua Ajuda a Pessoas com Transtornos Afetivos (Apta), também concebido por Maria das Graças e outros profissionais da Faculdade de Medicina da UnB. Os integrantes reúnem-se todos os sábados, entre as 15h e as 16h30. Para participar dos encontros, basta entrar em contato com a Faculdade de Medicina pelo telefone (61) 3107-1978.

Edição: Talita Cavalcante

 

 

Mais da metade dos portadores de transtorno bipolar não recebem tratamento

Agência Brasil

São Paulo – Mais da metade dos portadores de transtorno bipolar – 57,3% – não recebem tratamento, de acordo com um estudo mundial que avaliou 61.392 pessoas acima de 18 anos em 11 países. Em todo o mundo, 2,4% da população é acometida pela doença. No Brasil foram avaliadas mais de 5 mil pessoas concentradas na região metropolitana de São Paulo, das quais 42,7% estavam sendo tratadas. O transtorno bipolar traz ao indivíduo oscilações de humor entre depressão e euforia e pode causar irritabilidade, agressividade e ideias suicidas.

Segundo a coordenadora de Epidemiologia do Instituto de Psiquiatria da Universidade de São Paulo (USP) e responsável pela pesquisa no Brasil, Laura Helena de Andrade, muita gente não é diagnosticada e por ser uma doença grave, com muitas consequências na vida da pessoa, acarreta piora na qualidade de vida, incapacitação e possível agravamento da doença.

“Para mais pessoas serem diagnosticadas é preciso haver campanhas de esclarecimento, treinamento do profissional de saúde no atendimento primário que recebe a pessoa com problemas de comportamento com álcool e drogas, e o transtorno bipolar não é reconhecido”.

Laura ressaltou que 10% dos casos detectados no ano anterior à entrevista são graves e que geralmente os transtornos psiquiátricos são quadros crônicos que começam cedo na vida e por isso há prejuízos no desenvolvimento pessoal, educacional e profissional. No caso do transtorno bipolar, há uma repetição dos casos, que com o tempo se tornam cada vez mais graves e frequentes. “Compromete a vida toda do indivíduo e da família. O quadro é grave porque pode ser associado a taxas maiores de suicídio”, explicou.

O psiquiatra e coordenador do Programa de Transtornos Afetivos do Instituto de Psiquiatria, Ricardo Alberto Moreno, explicou que o portador de transtorno bipolar deve ser tratado por toda a vida com estabilizadores de humor, e não só nos surtos de depressão ou estado misto, que variam entre euforia e depressão. “Muitas vezes o médico recebe o paciente em estado de depressão e diagnostica como depressão unipolar erroneamente sem levar em consideração episódios anteriores ao do quadro atual. Se o paciente apresentar episódios de mania, euforia ou hipomania e depressão é fechado o diagnóstico de transtorno bipolar”.

Moreno ressaltou que o tratamento tem uma eficácia boa. Com o medicamento estabilizador de humor ministrado corretamente diminui-se muito a chance de novas crises ao longo da vida e isso faz com que o indivíduo tenha uma volta à sua vida normal ou próximo disso.

O garçom Rangel Lemes Antônio contou que antes de a doença ser diagnosticada ele vivia dentro de casa e não queria fazer nada, até que sua mãe procurou um especialista. Segundo ele, os momentos de depressão eram comuns e de repente se alteravam para euforia. “Depois do tratamento tive mais autoestima e o bipolar estabilizado é capaz de trabalhar. A sensação é a de me sentir normal, sem deficiência nenhuma. Na verdade tudo funcionava, só a cabeça não. Agora está funcionando até demais”.

O coordenador do Programa de Transtornos Afetivos do Instituto de Psiquiatria explicou que a doença se manifesta no início da vida adulta e na adolescência. “Nesse período as crises sucessivas podem comprometer o desenvolvimento da pessoa, e a cada crise o indivíduo sofre perdas importantes em todos os sentidos”.

Além disso, há as doenças que podem caminhar junto com o transtorno como o abuso no uso de álcool e das drogas, que pioram o quadro porque há o somatório do prejuízo de duas doenças ao mesmo tempo. “Podem aumentar as crises, os comportamentos de risco, a baixa adesão ao tratamento, fora a deterioração física ao longo do tempo. O importante é estabelecer estratégias diferenciadas tratando cada doença com os recursos disponíveis”, recomenda.

O psiquiatra destacou que a postura da família é muito importante porque ambos sofrem com as consequências da patologia, por isso é importante educar as pessoas que rodeiam o portador sobre o que é o transtorno bipolar. “Temos que lidar com alguns aspectos: a ignorância e a desinformação, o preconceito, inclusive instruindo o paciente de que ele não pode cair nessa armadilha. Eu costumo dizer que o transtorno bipolar é um aspecto da vida do paciente, mas não a vida toda dele”.