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Balão contra hemorragia agrava risco à vida de Sócrates, dizem médicos

Remoção urgente do balão instalado no esôfago de Sócrates: este é o nome do desafio que os médicos enfrentam desde o primeiro dia da segunda internação no hospital Albert Einstein, de São Paulo.   O dispositivo foi instalado emergencialmente no esôfago do ex-jogador para conter hemorragia por cirrose.  “É uma terapia de exceção e riscos. Por isso,  a técnica não é usada com frequência há mais de 20 anos”, informam médicos consultados pelo UOL Esporte.

O prazo de utilização do balão no esôfago ou estômago não pode exceder 24 horas, sob risco de provocar úlceras no paciente ou envio de sangue ao pulmão, por aspiração.

Na terça-feira (06/09) a equipe do hospital que atende o ex-jogador tentou retirar o dispositivo mas o sangramento voltou.

Cientificamente, o balão é conhecido por Sengstaken Blakemore, ou simplesmente SB. “O uso dessa técnica é uma exceção, hoje em dia”, disse o cirurgião e hepatologista Raymundo Paraná,  chefe do Serviço de Fígado da Universidade Federal da Bahia e presidente da Sociedade Brasileira de Hepatologia.

“A terapia é considerada de exceção por seus efeitos colaterais e por causar muito desconforto no paciente. Por isso, novas tecnologias  foram descobertas dos anos 80 para cá. O balão era usado entre os anos 70 e 80.  A decisão clínica de uso do balão é crítica. É uma questão de custo benefício onde o médico decide por salvar a vida do paciente em hemorragia, usando o que ele dispõe de mais adequado”, explicou  médico baiano.

 “O balão gera risco por sua manutenção no esôfago ou no estômago do paciente. O paciente pode aspirar o sangue e levá-lo para os pulmões, o que seria um fator de muita gravidade para o quadro clínico”, acrescentou Paraná.

BALÃO ISOFÁGICO, TERAPIA DE RISCO

  • Hepcentro

    Dispositivo foi usado para salvar vida de Sócrates

O médico explicou que o quadro clínico de Sócrates pode ter recomendado o uso do balão como última opção para salvar sua vida, “considerando que todas alternativas modernas como medicamentos associados a endoscopia teriam falhado”.  Ao saber que o trabalho da equipe do Einstein foi longo para estancar o fluxo hemorrágico, o  presidente da Sociedade Brasileira de Hepatologia explicou:

“Essa luta no atendimento pode justificar o uso  emergencial desse dispositivo. Ele é instalado entre o esôfago e o estômago. Com a insuflação (com ar) o produto funciona como um tamponamento. Como se você pressionasse a região hemorrágica com ataduras. Com a pressão de dentro para as paredes do esôfago, os pontos de varizes deixam de sangrar, mas há riscos”, reforçou Paraná.

A crítica ao uso atual do balão esofágico é aceita por outro especialista. “Porque surgiram outras tecnologias e medicamentos que estancam o sangue do esôfago, sem causar tantos problemas ao paciente. Os medicamentos são caros mas funcionam muito bem”, disse o gastroclínico Stéfano Gonçalves Jorge formado pela Unicamp e criador do site científico hepcentro (http://hepcentro.com.br).

Entre as tecnologias modernas usadas para contenção de hemorragia de estômago e esôfago destaques para as ligaduras elásticas e a cauterização por endoscopia. “Os medicamentos modernos ajudam a estabilizar o paciente. Se o sangramento for muito grande, largo a ponto de não poder ser contido, então o balão surge como última instância e riscos”, explicou Stéfano Gonçalves.

Vítima de cirrose hepática por alcoolismo, Sócrates foi internado no Albert Einstein duas vezes em dez dias. Na primeira vez, os médicos instalaram um dispositivo conhecido por Transjugular Intrahepatic Portosistemic Shunt, ou simplesmente tips. O dispositivo funciona como ponte e ajuda a reestabelecer o fluxo sanguíneo entre a veia portal do fígado até a jugular do pescoço.

O procedimento ajudou a diminuir a hipertensão das veias do fígado que recebem sangue do intestino, levando-o diretamente para o coração e outros órgãos. Naquele momento a hipertensão provocava sangramento do estômago. Agora, o sangramento subiu para o esôfago.

O presidente da SBH, Raymundo Paraná, alerta para outra doença causada pelo uso do tips: “o dispositivo ajuda a diminuir a hipertensão portal mas o sangue deixa de ser filtrado pelo fígado. As toxinas sobem diretamente do intestino para o coração e para o cérebro, gerando encefalopatia hepática, agravando o quadro do paciente”.

 

Foto 1 de 46 – Sócrates, Vladimir e Juca Kfouri em comício José Nascimento/Folhapress

 A cirrose transforma o fígado em camadas fibrosas, que impedem a passagem e filtragem do sangue, gerando gerando hipertensão venosa.

“Passando direto via tips, o sangue sobe com mais pressão e o coração pode sofrer problemas também. Além de filtrar, o fígado amortece o impacto do sangue nas veias”, explica Paraná.

Quando o sangue passa sem a filtragem do fígado diretamente para o coração e outros tecidos,  os riscos aumentam.  “Existe uma quantidade muito grande de amônia nesse sangue. No cérebro, essa e outras toxinas vindas do intestino geram danos ao paciente, variando em quatro graus”, explicou Paraná. “No primeiro grau, pode ocorrer perda de reflexo ao dirigir; no segundo, vem a sonolência e o efeito de tremor nas mãos, lateralmente, lembrando asas de borboleta;  o terceiro estágio apresenta alteração no comportamento, confusão mental, problemas urinários  e falta de comunicação social. O último estágio é o coma."

Em graus variados a incidência de encefalopatia hepática por uso de tips fica entre entre 12% e 34%, segundo trabalho publicado pelo médio Julio Cesar Pisani, professor adjunto de gastroenterologia, da Universidade Federal do Paraná.

O  tips induz ao primeiro grau da encefalopatia hepática, “mas os pacientes que já apresentam os sintomas do desequilíbrio tóxico terão a situação agravada”, disse Paraná.

Com a prática cirúrgica em centenas de pacientes, o hepatologista desmonta o mito de que a bebida alcoólica não faz mal à saúde.

“Não existe bebida mais leve. O que existe é dosagem alcoólica”, afirma o médico hepatologista. Quem consumir  mais de 80 gramas de álcool por dia entrará no grupo de risco de contrair doenças em todos os órgãos, não apenas no fígado. O álcool é um tóxico completo, afeta todos os tecidos, dos testículos ao cérebro”, finalizou Paraná.