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‘RS terá dificuldades jamais vistas’, diz Feltes

Marco Weissheimer, Sul 21 – “A sociedade gaúcha irá se deparar com momentos de dificuldade com os quais jamais viveu”. A frase não é de um representante da oposição ao governo de José Ivo Sartori (PMDB), mas do próprio secretário da Fazenda, Giovani Feltes, que realizou nesta quarta-feira (7) a primeira reunião de sua equipe diretiva. Ao falar das dificuldades financeiras do Estado, Feltes projetou um déficit de R$ 5,3 bilhões para 2015, repetiu os mantras da austeridade que vem marcando as manifestações do novo governo e anunciou “dificuldades jamais vistas” pela população do Rio Grande do Sul. O secretário garantiu, por outro lado, que os serviços essenciais não serão prejudicados. “Está na hora de mudar, de fazer o que deve ser feito”, acrescentou, assinalando que as fontes que serviam para enfrentar o déficit (caixa único, depósitos judiciais e novos empréstimos) estão esgotadas.

As declarações de Giovani Feltes repetem um discurso que vem dominando as políticas econômicas adotadas na Europa após a crise financeiro-econômica de 2008. A dimensão e a realidade de um Estado como o Rio Grande do Sul é diferente, obviamente, daquela vivida pelos países europeus, mas alguns dilemas e escolhas se repetem. Um dos principais é: o corte de investimentos públicos e a diminuição do papel do Estado é um caminho eficiente para superar uma situação de crise econômico-financeira? Outro: como evitar o aumento do desemprego, fenômeno que costuma acompanhar esse tipo de medida?

Sindicatos de empresas que prestam serviços ao Estado já advertiram que a suspensão do pagamento de fornecedores pode provocar milhares de demissões e paralisação de obras. Ricardo Sessegolo, diretor do Sinduscon, disse à rádio Guaíba: “Não pode simplesmente dizer não pago por seis meses. Suspensão vai gerar atraso ou cancelamento de obras ou reparos em escolas e presídios, podendo até afetar o calendário escolar”. O Sindicato das Empresas de Asseio e Conservação do Estado do Rio Grande do Sul (Sindasseio) prevê até 20 mil demissões entre prestadores de servidores com a suspensão dos pagamentos por 180 dias.

Os exemplos que vêm da Europa

Em países como Grécia, Espanha, Portugal e Itália, os anúncios de austeridade e sacrifícios vieram acompanhados de arrocho, desemprego e recessão. Os países citados sofreram a intervenção da chamada “troika” (Fundo Monetário Internacional, Comissão Europeia e Banco Central Europeu). A austeridade foi aplicada por meio de um aumento dos impostos sobre o trabalho e, principalmente, pela via da redução do apoio social aos desempregados, dos investimentos públicos em saúde e educação. O resultado, do ponto de vista social, foi trágico:

Na Grécia, o desemprego entre os jovens ultrapassou os 50%; em Portugal, ultrapassou os 40%. A taxa de desemprego na Itália atingiu 13,4% em novembro de 2014, o maior nível da história do país, segundo dados do instituto de estatísticas Istat. A taxa de outubro foi de 13,3%. Entre a população jovem, com idades entre 15 e 24 anos, o desemprego saltou para 43,9% em novembro, também estabelecendo novo recorde. Em 2014, o problema do desemprego foi mais crítico na Espanha e na Grécia: no mês de setembro do ano passado, nesses dois países, a taxa de desemprego entre os que têm menos de 25 anos passou dos 50%. Na Espanha, foi de 53,7%, e na Grécia, de 50,7%. O fracasso das políticas de austeridade na Grécia pode ter como expressão política a vitória do partido Syriza, da esquerda radical, nas eleições que serão realizadas este ano.

As políticas de austeridade fracassaram em um de seus objetivos centrais: a diminuição da dívida pública dos países. A maioria dos países que seguiu esse caminho viu sua dívida aumentar e seu crescimento econômico despencar. Grécia, Espanha e Itália tiveram um crescimento negativo. Nas cinco maiores economias da União Europeia (Reino Unido, Alemanha, França, Itália e Espanha) houve um crescimento da dívida pública entre 2007 e 2013. Os críticos desse modelo definem assim a lógica que alimenta o crescimento da dívida: as políticas de austeridade reduzem a demanda de bens e serviços; com isso, provocam uma queda do crescimento econômico. Esta queda gera menos recursos para o Estado, aumentando o déficit e a dívida pública e estabelecendo um círculo vicioso.

Prêmio Nobel de Economia em 2001, Joseph Stiglitz qualificou as políticas de austeridade seguidas por toda a Europa para enfrentar a crise da dívida como um “completo fracasso”. Segundo ele, o elevado desemprego e o fraco crescimento ilustram esse fracasso e “o enorme preço que a Europa está pagando por aplicar essas políticas”. Na mesma direção, outro importante economista, o sul-coreano Ha-Joon Chang, sustenta que as políticas de austeridade na Europa, ao comprimirem salários, cortarem gastos sociais e causarem desemprego abriram as portas para conflitos sociais na região.

No final de 2014, autoridades econômicas europeias reuniram-se em Bruxelas para discutir o lançamento de um novo programa de investimentos públicos e privados capaz de estimular a atividade econômica e salvar a Europa de uma nova recessão. A Comissão Europeia preparou um plano de investimentos de 300 bilhões de euros, considerado insuficiente por socialistas e liberais. Os primeiros querem um programa de 800 bilhões de euros e os segundos de 700 bilhões.

As realidades são distintas, mas algumas palavras, fórmulas e diagnósticos se repetem: austeridade, sacrifício, ajuste fiscal, cortes de gastos, aperto de cinto. Considerando o anúncio feito pelo Secretário da Fazenda de que a “sociedade gaúcha irá se deparar com momentos de dificuldade com as quais jamais viveu”, acompanhar o legado das políticas de austeridade na Europa pode ajudar a entender o que vem por aí na economia e na vida social do Rio Grande do Sul.