A lama que emporcalhou a "famiglia" Fifa e se espalhou pelo mundo com as prisões de sete dirigentes, entre eles o ex-presidente da CBF, José Maria Marin, não passa de recheio dentro de um tsunami de escândalos, tráfico de influência, compra de votos e distribuição de propinas. Nas entranhas da entidade que comanda o futebol mundial há muito de tudo o que se possa imaginar: mentiras, fraudes, corrupção e por aí vai. A lista de todo o tipo de má conduta que permite malfeitos parece interminável.
No que diz respeito ao Brasil, as revelações sobre a dinheirama que rolou por fora na forma de suborno no contrato assinado entre CBF e Nike em 1996 são tapas e tabefes na nossa cara. Uma vergonha, isso sim. Há exatos 15 anos o Congresso Nacional teve a oportunidade rara para destrinchar toda a negociata comandada pelo ex-presidente Ricardo Teixeira na famosa CPI da Nike e nada aconteceu. Criada para apurar irregularidades denunciadas na época, a Comissão Parlamentar de Inquérito acabou em pizza. O relatório final, que não foi aprovado, pedia o indiciamento de Teixeira por evasão de divisas e lavagem de dinheiro.
A bancada da bola, comandada pelo então deputado Eurico Miranda pelo PPB-RJ, jogou no lixo nove meses de trabalho. Mais tarde, a justiça se encarregou de absolver Ricardo Teixeira de onze crimes que foram apontados pela CPI. Foi tudo para debaixo do tapete. Mas a justiça americana recuperou as investigações sobre a roubalheira e botou um fim na impunidade que estes tristes trópicos insistem em garantir desde sempre e para sempre. O contrato gerou R$ 47 milhões em propinas para um certo Conspirador 13, segundo a confissão de José Hawilla, dono da Traffic, empresa que negocia direitos de televisão e que intermediou a transação. Lembrando que Ricardo Teixeira era o presidente da CBF.
Em outro acordo secreto, sempre de acordo com o que disse J. Hawilla à justiça americana, a Nike se comprometeu a pagar R$ 120 milhões para a Traffic em conta na Suíça, de um total de R$ 480 milhões. Deste valor, R$ 94 milhões foram efetivamente pagos. O tal conspirador 13 ficou com R$ 47 milhões. O nome do ex-presidente da CBF não aparece neste escândalo porque até agora ele não foi indiciado pelo Departamento de Justiça americano. Mas autoridades afirmam que a investigação está apenas no começo.
O presidente da Fifa Joseph Blatter, que hoje coloca a entidade à disposição das polícias americana e suíça, condenou em 2000 a investigação dos parlamentares comandados pelo então deputado pelo PC do B, Aldo Rebelo, e lançou no ar sérias ameaças. "O Brasil será suspenso de todas as atividades internacionais. O Brasil não participará da Copa do Mundo de 2002, nem do mundial Sub-20, nem do mundial Sub-17, nem da Copa do Mundo Feminina de Futebol". Decisivas ou não, as intimidações surtiram efeito.
Por fim, Joseph Blatter anunciou o banimento temporário de José Maria Marin e de outros 10 dirigentes envolvidos nas investigações da justiça americana. Marin dividiria com outros corruptos R$ 346 milhões pagos pela empresa uruguaia Datisa, criada pela Traffic e por outras duas agências de marketing para a negociação de direitos de transmissão da Copa América. Claro que esta medida tomada por Blatter faz parte da tradição de quem se protege numa "famiglia". É a tal atitude mais velha do que andar pra frente: a Fifa entrega os anéis para salvar os dedos.