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‘MP é marco para regrar o futebol brasileiro’

Deputado Vicente Cândido (PT-SP), que trabalhou de forma intensa para aprovar as novas regras, diz que a MP do Futebol é "muito significativa" para a recuperação financeira dos clubes e "coloca um novo marco para regrar o futebol brasileiro"; ao mesmo tempo, diz ele, o projeto não pode ser encarado como a "panaceia para o esporte"; "Agora o que falta é o investimento pesado do Estado, e a escola é o caminho para isso, para se descobrir talentos", defende o parlamentar, em entrevista ao 247; "Ou investe ou não dá para esperar que só as entidades vão resolver o problema da falta de se subir nos pódios", acrescentou; segundo ele, o desafio nas próximas semanas será se debruçar sobre mais "matérias importantes", como de questões trabalhistas, mudanças no conceito de tributação e atualização do estatuto do torcedor; "Nesse semestre queremos dar conta disso", prevê.

 

Gisele Federicce, 247 – Não houve vencidos nem vencedores na aprovação da Medida Provisória 671/2015, a chamada ‘MP do Futebol’. Essa é a avaliação do deputado federal Vicente Cândido (PT-SP), um dos que trabalharam intensamente por mudanças em favor da modernização do futebol brasileiro.

A conclusão pode nos levar à seguinte avaliação: se dos 7 a 1 tomados da Alemanha na Copa do Mundo de 2014, não pudemos, agora, chegar ao empate com a aprovação da MP, marcamos ao menos mais três ou quatro gols. "O projeto é muito significativo, coloca um novo marco para regrar o futebol brasileiro", opina o deputado.

Segundo Cândido, o projeto aprovado este mês na Câmara e no Senado, que cria o Programa de Modernização da Gestão e Responsabilidade Fiscal do Futebol Brasileiro (Profut), é "muito importante para o fortalecimento dos clubes brasileiros". A proposta é refinanciar as dívidas fiscais e trabalhistas dos clubes, em troca de uma gestão mais responsável. Como o texto original sofreu mudanças na passagem pelo Congresso, é necessária agora a sanção do projeto pela presidente Dilma Rousseff.

Intervenção estatal – "Você sempre consegue no Congresso a média do que é possível negociar, não teve nem vencido nem vencedor", disse o deputado, em conversa com o 247 nesta semana, a respeito do projeto como um todo. Como exemplo, ele citou o debate sobre a intervenção estatal no futebol. Entre os pontos polêmicos, e que geraram muitas críticas no meio esportivo, estão sanções como rebaixamento de clubes e limitação de mandatos de dirigentes.

"Se teria mais ou menos intervenção do Estado nas entidades esportivas, a gente preservaria o artigo da Constituição. Mas essa participação do Estado, quando envolve dinheiro público, quando tem aí um caráter de interesse público, acaba sempre vencendo a não intervenção. Mas por fim, não foi tudo o que o governo queria, que era uma intervenção muito pesada, e também não foi tudo o que os clubes queriam", explicou o parlamentar.

De acordo com o deputado, que também é dirigente da CBF (Confederação Brasileira de Futebol), "há aí uma intervenção estatal, dada a conjuntura, com investigações atingindo a Fifa, que acaba permitindo situações como essa da exigência da limitação de mandato dos que aderirem ao projeto. Isso eu não achava que deveria ser parte do projeto de lei, porque os clubes já fizeram e as entidades já iam fazer. Acabou passando, mas não é o principal problema".

Regras financeiras – Na parte financeira, também na avaliação do deputado, "o governo foi generoso". Os débitos dos clubes que aderirem ao Profut poderão ser divididos em até 240 parcelas de no mínimo R$ 3 mil, com redução de 70% das multas, de 40% dos juros e de 100% dos encargos legais. "Por outro lado, existe a contrapartida para que não se façam mais peripécias com o dinheiro público. Em vez de pagar imposto, ficar fazendo altas contratações", exemplifica.

Formação do atleta – Um ponto essencial, como destaca Cândido, é o investimento na formação do atleta, área que agora receberá "o seu quinhão". Além disso, algumas alterações na Lei Pelé trazem "um novo conceito do desporto educacional". "A partir de 12 anos, o jovem poderá passar a fazer treinamentos nos clubes, algo que será interpretado como extensão da escola. Com a lei atual, isso seria visto como exploração de mão de obra, como trabalho infantil. Nós estamos dizendo que isso é prática esportiva educacional", explica.

Papel do empresário – O projeto traz "um regramento bastante preciso sobre o papel do empresário", destaca o deputado, lembrando que é algo que "a Fifa previu e estamos regulamentando". Trata-se da proteção do investimento que o clube fez em um atleta ao longo dos anos, para se evitar que um empresário "chegue, assine um contrato, mande ele para o exterior e fature uma fortuna". "Estamos colocando limitações, o clube vai ter mais preponderância", diz.

Representação para o esporte – "Não vamos encarar o projeto como a panaceia para o esporte. É um ponto importante, mas você tem a questão cultural e tem a econômica, tem que melhorar a situação dos clubes… todo mundo acaba sendo vítima do momento econômico que a gente vive", coloca Vicente Cândido, acrescentando, porém, que "podemos dizer o seguinte: falta de regramento, de transparência e de segurança jurídica não será mais motivo para críticas no futebol brasileiro".

"Agora o que falta é o investimento pesado do Estado para o esporte, e a escola é o caminho para isso, para se descobrir talentos. E isso não tem na escola brasileira, como tem em Cuba, onde se leva isso muito a sério, na China, na Alemanha… ou o Brasil faz isso ou não dá para esperar que só as entidades vão resolver o problema da falta de se subir nos pódios", ressalta.

Para ele, "tem que se fazer uma revolução na educação, não é só aprender matemática, e o Brasil é muito negligente nessa matéria. Eu sempre estou cobrando o papel do Estado. A verdade é que o governo não faz o dever de casa e quer cobrar os outros, acha que o problema está no Corinthians… a formação intelectual é responsabilidade do estado brasileiro".

Próximas ações – Apesar da aprovação da MP, há ainda, segundo Cândido, "matérias importantes" a serem debatidas, o que deve acontecer no próximo semestre. "Vamos ter que nos debruçar nas próximas semanas em um dispositivo especial sobre a questão trabalhista no esporte, por exemplo, mudar o conceito de tributação, atualizar o estatuto do torcedor, que está fora de moda… nesse semestre queremos dar conta disso", afirmou.

Investigação na CBF – Os contratos da CBF se tornaram alvo de investigação da Polícia Federal depois que o FBI, a polícia norte-americana, desvendou um escândalo de corrupção envolvendo a Fifa. Como representante da principal entidade brasileira de futebol, o parlamentar é da opinião de que a Confederação "está tranquila e tem tomado medidas para consertar isso".

"Os contratos ao longo da vida não foram os melhores, precisam ser melhorados, mas a entidade tem notificado, tem rediscutido os contratos… A partir da nova direção, com certeza teremos contratos mais firmes e seguros para a necessidade do futebol brasileiro. Tem que se apostar no futuro, que as novas direções venham a consertar isso", conclui o deputado.

ENTENDA AS REGRAS DO PROFUT

Os clubes que quiserem aderir ao programa de refinanciamento de dívidas com a União poderão dividir seus débitos em até 240 parcelas de no mínimo R$ 3 mil, contando com redução de 70% das multas, de 40% dos juros e de 100% dos encargos legais. As primeiras 60 parcelas poderão ser reduzidas em até 50%, mas esse desconto deverá ser coberto posteriormente. Os clubes se comprometem a reduzir o déficit para 10% da receita anual a partir de 2017, e 5% a partir de 2019.

A permanência no Profut é condicionada ao cumprimento de uma série de práticas de gestão e responsabilidade fiscal. Os clubes não poderão mais antecipar receitas, como os direitos de televisão, previstas para depois do término da gestão vigente (exceto um limite de 30% para reduzir a dívida), e deverão limitar seus gastos com folha de pagamento de atletas a 80% dos rendimentos. Entre outras regras estão o pagamento em dia de salários e direitos de imagem, a limitação do mandato presidencial (quatro anos e uma reeleição), a regularidade das obrigações trabalhistas e tributárias e a manutenção de conselho fiscal autônomo.

Os dirigentes responsáveis pelos clubes passam a ficar passíveis de responsabilização individual por atos de gestão temerária praticados durante seus mandatos. As penas são o afastamento do cargo e a inelegibilidade na agremiação por período de até dez anos, além da possibilidade de responder solidariamente por atos irregulares praticados em gestões anteriores. Cada clube terá a prerrogativa de decidir, por seus mecanismos internos, a respeito da culpabilidade do dirigente flagrado.

O cumprimento das responsabilidades pelos clubes será fiscalizado por um novo órgão: a Autoridade Pública de Governança do Futebol (Apfut), criada no âmbito do Ministério do Esporte. Ela terá a prerrogativa de comunicar à Receita eventuais descumprimentos, que implicam em rescisão do refinanciamento, e de receber denúncias em relação a más prática de gestão.

Federações

As federações estaduais e a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) também são alvo da MP, que estabelece para elas regras de transparência na gestão semelhantes àquelas que são cobradas dos clubes participantes do Profut. As entidades organizadores de competições ficam também obrigadas a punir com rebaixamento os clubes que não cumprirem regularmente com as obrigações trabalhistas e tributárias – independentemente de adesão ou não ao programa de refinanciamento.

Outra mudança promovida pela MP no funcionamento das federações diz respeito às eleições internas para a presidência. A proposta expande o colégio eleitoral, incluindo todos os clubes das duas primeiras divisões da principal competição organizada pelas entidades – os respectivos campeonatos estaduais ou, no caso da CBF, o campeonato brasileiro.

Loterias

A MP cria também duas loterias para angariar recursos para os clubes, além da já existente Timemania. As premiações de todas as três serão isentas do pagamento de Imposto de Renda e sua exploração poderá ser concedida à iniciativa privada.

A loteria instantânea (raspadinha) Lotex beneficiará os times de futebol que aderirem e concordarem quanto ao uso de suas marcas e símbolos. Os clubes, inclusive os de outros esportes, poderão atuar como agentes lotéricos. Do total da arrecadação, 10% serão destinados a projetos de iniciação desportiva escolar do Ministério do Esporte, e 2,7%, irão para os clubes.

Já a loteria por cota fixa será uma espécie de bolsa de apostas sobre os resultados de quaisquer esportes. Do total arrecadado, 7% serão revertidos para projetos do Ministério do Esporte. Os clubes receberão 3%, e deverão usar esse aporte para investir na formação de atletas e no futebol feminino e para subsidiar ingressos a preços baixos. Essa loteria poderá ser administrada tanto pela Caixa Econômica Federal quanto por empresas, por meio de concessão.

No caso dos recursos de ambas as loterias destinados ao Ministério do Esporte, eles deverão ser aplicados exclusivamente em projetos para as modalidades olímpica e paralímpica. Esses projetos poderão ocorrer em escolas públicas ou em estabelecimentos privados localizados em municípios com Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM) baixo ou muito baixo.

Com Agência Câmara