Cotação do dia

USD/BRL
EUR/USD
USD/JPY
GBP/USD
GBP/BRL
Trigo
R$ 115,00
Soja
R$ 180,00
Milho
R$ 82,00

Tempo

A posição da Ministra Rosa Weber no HC do ex-Presidente Lula

Percebe-se que a Ministra, com a devida vênia, privilegiou a forma sobre o conteúdo.

 

O habeas corpus só foi inferido porque a Ministra Rosa Weber não seguiu o posicionamento que ela própria disse que possui. (Fellipe Sampaio / SCO/ STF)

Por Michel Reiss*

De início, registro que o presente texto não pretende discutir qualquer tipo de questão político-partidária. Busca-se apenas tecer comentário de natureza eminentemente jurídico acerca da posição da Ministra Rosa Weber no julgamento do habeas corpus do ex-Presidente Lula, ocorrido na última quarta-feira, dia 04 de abril.

Como se sabe, o pedido para aguardar o julgamento em liberdade foi indeferido por seis votos a cinco. Consequentemente, foi cassada a liminar anteriormente concedida. No âmbito do Tribunal Regional Federal da 4a Região se aguarda se a defesa do ex-Presidente era interpor novo recurso de embargos de declaração contra o acórdão dos primeiros embargos (os chamados “embargos de embargos”). Caso a resposta seja negativa, já será expedido mandado de prisão. Caso ocorra a interposição, deverá ser aguardado o julgamento pelo Tribunal – o que não costuma tardar. O prazo vence no início da próxima semana.

Retornando ao julgamento do habeas corpus, já se sabia que o fiel da balança estava no voto da Ministra Rosa Weber. Conhecia-se a posição dos outros dez Ministros. A propósito, o Min. Gilmar Mendes, que em 2016 se posicionou pela possibilidade de execução provisória da pena a partir da 2a Instância, já havia adiantado em entrevistas que mudaria de posição – como realmente mudou. (Sobre esse histórico na execução provisória na pena, já publicamos um texto no Dom Total, em 02 de março último. Clique aqui para conferir!

Já Rosa Weber, quando o Supremo mudou de posicionamento para admitir a execução provisória, foi voto vencido. Isso ocorreu por ocasião do julgamento das medidas cautelares nas Ações Diretas de Constitucionalidade 43 e 44, em 2016. Ela se posicionou de forma a dar mais eficácia ao princípio do estado de não-culpabilidade (ou presunção de inocência), ou seja, a execução da pena só poderia ocorrer após o efetivo trânsito em julgado – ressalvadas, obviamente, as situações envolvendo prisões cautelares.

Portanto, desde o referido julgamento, a posição do STF modificou para admitir a prisão após o esgotamento da 2a Instância. A partir de então, a Ministra Rosa Weber, invocando o princípio da colegialidade, passou a indeferir os habeas corpus que era a ela distribuídos, apesar de ressalvar seu posicionamento pessoal.

Pela primeira vez desde o julgamento de 2016, o tema retornou ao Plenário do Supremo Tribunal Federal na última quarta-feira. Os ministros rediscutiram o tema, expondo seus posicionamentos, e decidiram de acordo com as respectivas interpretações acerca do alcance do princípio do estado de não-culpabilidade. Como já foi dito, o Min. Gilmar Mendes inclusive mudou seu posicionamento.

Já a Ministra Rosa Weber se manifestou de forma peculiar. Ela optou por não rediscutir o tema – apesar de dizer expressamente que o Plenário é o “locus” para que as questões sejam revisitadas (como aliás fizeram os demais ministros). A Ministra optou por seguir o posicionamento fixado por ocasião do julgamento das cautelares nas ADC’s 43 e 44, afirmando que não via motivos para desrespeitar a jurisprudência do Supremo – especialmente porque estava em julgamento uma ação de habeas corpus individual, ao contrário da ADC, que gera efeito “erga omnes”. Ao final, consignou que ressalvava seu ponto de vista pessoal, até mesmo porque ainda ocorrerá o julgamento final das mencionadas ADC’s.

É possível afirmar que há lógica para justificar a posição adotada pela Ministra Rosa Weber. Por outro lado, percebe-se que a Ministra, com a devida vênia, privilegiou a forma sobre o conteúdo. Ela considerou que o precedente anterior possui mais relevância do que a liberdade. E é isso que não se pode admitir. Nessa linha se manifestou o Ministro Lewandowski: a vida e a liberdade não são passíveis de restituição. Ou seja, a modificação de um título condenatório de um réu em execução provisória trará prejuízo irreparável: o tempo em que permaneceu preso injustamente não volta.

O que mais impressiona é que, mesmo reconhecendo que o Plenário é o local de rediscutir os temas, optou por não fazê-lo, o que foi decisivo na contagem final de seis a cinco. Esse o paradoxo: o habeas corpus só foi inferido porque a Ministra Rosa Weber não seguiu o posicionamento que ela própria disse que possui. E a liberdade, com todo o peso que a Constituição lhe dá, fica num segundo plano.

Repito: a forma prevaleceu sobre o conteúdo. Agora se espera que a Ministra Carmem Lúcia, Presidente da Corte, coloque em pauta de julgamento as Ações Diretas de Constitucionalidade, como insistiu o Ministro Marco Aurélio na última quarta-feira.

Independente da posição final que tomarão os ministros, não há tema mais relevante para ser tratado no Supremo Tribunal Federal do que a liberdade do ser humano – ressaltando que a grande “clientela” do sistema criminal de justiça é formada pela base da pirâmide social, o que torna a questão ainda mais importante.

Ps.: entrou em vigor no último dia 04 de abril a Lei n. 13.641/2018, que acrescentou na Lei Maria da Penha o crime de descumprimento de medida protetiva. Passa a existir o art. 24-A, que tornou criminosa a seguinte conduta: “descumprir decisão judicial que defere medidas protetivas de urgência previstas nesta Lei: Pena – detenção, de 3 (três) meses a 2 (dois) anos”.

*Michel Wencland Reiss é mestre em Ciências Penais pela UFMG. Doutor em Direito pela PUC-Rio/ESDHC. Ex-Presidente da Comissão de Exame de Ordem da OAB/MG. Ex-Conselheiro Titular do Conselho Penitenciário de Minas Gerais. Membro fundador e Conselheiro Instituto de Ciências Penais – ICP. Membro do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais – IBCCrim. Professor da Escola Superior Dom Helder Câmara. Advogado.

 

dom total///