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Prejuízos pela irresponsabilidade

O ralo por onde escoam nossas riquezas é de diâmetro incalculável, uma bocarra de voracidade sem limites

 

 

Juntando os gastos decorrentes de inundações de cidades, causadas por bueiros entupidos com o lixo jogado pela população os prejuízos são incalculáveis (Pixabay)

 

Por Evaldo D’ Assumpção*

Há alguns anos, fiquei chocado com uma experiência feita no Rio de Janeiro: um grupo de pesquisadores recolheu, nas lixeiras de Copacabana, todos as sobras de alimento aproveitável que ali foram jogadas num único final de semana. Analisando-as, chegaram à conclusão de que eram suficientes para alimentar toda a Zona Norte do Rio de Janeiro, por uma semana. 

Na construção civil, já se disse que de três edifícios construídos, restava desperdiçado material suficiente para construir um outro. Entrando no campo da corrupção, do superfaturamento de obras e serviços, chegamos a números estratosféricos. E mais: como médico, impressionava-me a quantidade de medicamentos, material cirúrgico e outros insumos que eram jogados fora, mesmo em condições éticas de reaproveitamento, ou perdidos por falta de cuidados. Qual o profissional observador e consciente não detecta a mesma coisa em suas áreas operacionais?

O Brasil é um país riquíssimo em recursos naturais e isso lhe deveria dar uma condição privilegiada entre os chamados países do primeiro mundo. Contudo, o ralo por onde escoam nossas riquezas é de diâmetro incalculável, uma bocarra de voracidade sem limites. 

Voltando os olhos para o elevado custo operacional da nação brasileira, descobriremos que as mazelas que atormentam quase toda a sua população, existem, não somente pela incúria dos administradores, mas também pela falta de recursos públicos, consequência do enorme desperdício da renda nacional. Mas a causa maior é a irresponsabilidade dos próprios brasileiros, cuja falta de consciência, sua falta de educação básica e adequada, e o desconhecimento da existência e importância do uso correto dos meios de prevenção de acidentes, constantemente os torna vítimas de si próprios, exigindo gastos enormes do serviço público, especialmente da área de saúde, para tratar as consequências da imprudência, da ignorância e do descaso.

Basta andarmos pelas ruas das grandes e pequenas cidades, para constatarmos, em todos os lugares e a todo momento, situações absolutamente inaceitáveis de exposição a acidentes. E boa parte delas, sem qualquer ação educativa e punitiva para seus autores.

Olhando as muitas construções civis, novas e de reformas, observamos a quantidade de trabalhadores sem qualquer equipamento de segurança pessoal, e quando o estão utilizando, quase sempre o fazem somente para parecer que os utilizam, pois não estão colocados correta e completamente. São desconfortáveis, alguns alegam, porém se o usassem sempre, com certeza ficariam habituados, e até sentiriam sua falta, quando não os estivessem usando. 

Exemplo disso são os cintos de segurança, em automóveis. Alguns motoristas, especialmente profissionais, alegando o tal desconforto chegam ao absurdo de romper suas molas indispensáveis, deixando-os jogados e soltos sobre o tórax, somente para evitar as multas por sua ausência. 

Outros colocam presilhas para afrouxar a necessária pressão, ignorando que daquela maneira estão sujeitos até a serem enforcados pelos cintos. Pior ainda quando se trata de crianças, que não aceitando de imediato as cadeiras apropriadas, ficam inteiramente soltas dentro do carro, colocando em risco suas vidas e as dos demais passageiros, que poderão ser atingidos pelo corpo da criança em caso de abalroamento. Não se pode deixar de falar dos cachorros que saltam livremente por todo espaço do carro, ou ficam no colo do motorista que exibe, todo pimpão, o seu totó querido. A irresponsabilidade não é da criança ou dos pets, mas do adulto, a quem cabe a condução do veículo e o zelo pela segurança de seus transportados.

Poderia escrever páginas e mais páginas dessas situações absurdas, agravadas pelas falta de um policiamento rigoroso para punir severamente a esses irresponsáveis que não possuem qualquer estima por si próprios, tampouco levam em conta as possíveis consequências de sua imprudência. Alguns ainda afirmam: “Comigo isso não acontece, pois sou muito cuidadoso”. Pior ainda quando dizem “Deus me protege!”, como se o Criador fosse responsável pela sua total irresponsabilidade! Melhor seria se dissesse: “Sou totalmente inconsequente!” 

Mas temos ainda o outro lado, quando essas atitudes irresponsáveis e até mesmo criminosas, se transformam em tragédias, ceifando vidas, mutilando e inutilizando pessoas, enlutando famílias. São também vultosas as despesas para o país, pois quase sempre tais casos acabam nas instituições públicas, a quem caberá consertar o que for possível. Só para se ter uma ideia, levantamentos mostraram que somente o SUS teve, em 2016 um gasto de R$ 253 milhões com o tratamento de vítimas de acidentes de trânsito. Se calcularmos os gastos com perdas materiais, danos ao patrimônio particular e público, suspensão de ganhos, desperdício na educação e formação de muitos profissionais que morreram, ficaram mutilados ou inativos, o custo global da irresponsabilidade alcança a astronômica cifra de R$ 100 bilhões.  

Juntando os gastos decorrentes de inundações de cidades, causadas por bueiros entupidos com o lixo jogado pela população; os casos de dengue e outras moléstias transmitidas por mosquitos “cultivados” nos quintais de irresponsáveis moradores, os prejuízos são incalculáveis. Obviamente não será possível zerar tudo isso, mas se for instituída uma educação cívica e moral no país, com atuação especialmente nas crianças em seus primeiros anos escolares, fortemente reforçada pela educação e o exemplo dos familiares, certamente teremos um país para nossos netos se orgulharem dele. Somente educação e cultura poderão mudar, radicalmente, esse quadro absurdo. Nunca é tarde para começar, mas há que se começar agora.

*Evaldo D’ Assumpção é médico e escritor

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