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Tempo

Glenn e a antropofagia de Oswald

O assustador péssimo desempenho da bancada dos "entrevistadores" do último Roda viva é exemplo cabal do que digo e não deixa dúvidas a quem ainda as tinha de como o verdadeiro jornalismo está agonizante.

 

O único jornalista presente era justamente o entrevistado Glenn Greenwald. (Reprodução)

 

Por Ricardo Soares*

Houve um tempo – e não faz muito – que jornalistas eram jornalistas. Faziam perguntas pertinentes, acreditavam no falso mito da imparcialidade, tinham ciência dos veículos para os quais trabalhavam, mas não se comportavam meramente como vozes dos seus patrões. Esse tempo se esvaiu no espaço e agora o modus operandi vigente é exatamente a superlativa vassalagem, "profissionais" que se comportam de maneira "corporativa" e formal mesmo fora de suas corporações.

O assustador péssimo desempenho da bancada dos "entrevistadores" do último Roda viva é exemplo cabal do que digo e não deixa dúvidas a quem ainda as tinha de como o verdadeiro jornalismo está agonizante. Vale ressaltar que o único jornalista presente era justamente o entrevistado Glenn Greenwald, que, resposta atrás de resposta, ensinou jornalismo àquela patética bancada de inquisidores mal preparados, caretas, absolutamente mais preocupados em desqualificar o profissional que entrevistavam do que em lhe fazer perguntas de fato pertinentes. É a ideologia transcendendo o debate. 

Fiquei estarrecido mas não esperava o contrário! Os jornalistas, feitos do mesmo material de muitos que, inclusive, se acovardam diante da deseducação do nosso Bozo Presidente, só lançaram pegadinhas a Glenn e mantiveram a versão oficial da dupla de justiceiros Moro/Dallagnol, da qual se apropriou o desgoverno e a maior parte da mídia. Isenção zero e ainda confundiram a função de repórter com a de policia. Ou talvez achem que a essa altura é tudo a mesma coisa. 

Uma moça, péssima por sinal, chegou a sugerir, como policial, que o jornalista entrevistado agiu como criminoso ao divulgar material vazado por hacker. Glenn, é óbvio, engoliu todos eles. Não apenas porque é muito mais preparado, muito mais lido e muito mais vivido . Mas porque sabe o que é jornalismo e o que é release pró-governo.

Nos tempos de redes sociais velozes esse assunto torna-se velho na quinta-feira, quando na própria segunda e terça já explodiam. Mas não custa lembrar que muitos de nós jornalistas – e não comunicadores, digitais influencers, coachings de palavras – ainda acreditam naquele velho jornalismo que era feito para explicar aos leitores premissas que eles não entendiam. Agora, a maioria vem para confundir, atirar titica na Geni, assumir a voz dos patrões. Jornalismo digital, ora pois. Sigo lembrando a velha frase de Oswald de Andrade ressuscitada pelo velho amigo Gabriel Priolli: "A gente escreve o que ouve. E não o que houve". Visionário como sempre esse Oswald.

*Ricardo Soares é diretor de TV, roteirista, escritor e jornalista. Publicou oito livros, dirigiu 12 documentários

 

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