Brasileiros começaram a declarar nesta semana, mas milhões poderiam ficar fora da ‘contribuição’
Com correção, número de isentos passaria de 10 milhões para 20 milhões (Marcello Casal Jr/ABr)
Rômulo Ávila
A declaração de Imposto de Renda 2020, ano-base 2019, começou nesta semana, mas cerca de 10 milhões de trabalhadores não teriam que se preocupar com a mordida do Leão se a tabela fosse corrigida. Estudo do Sindicato dos Fiscais da Receita Federal, o Sindifisco Nacional, aponta que a diferença entre o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) acumulado de 1996 a 2019 e a correção da tabela no mesmo período chega a 103,87%. O Sindifisco estima que a faixa de isenção deveria atingir pessoas que recebem até R$ 3.881,85 mensais e não R$ 1.903,98 por mês, como ocorre atualmente. Para o advogado e professor de Direito Tributário da Dom Helder, Pedro Eliezer, a falta de atualização é um problema real que gera aumento significativo no número de contribuintes, especialmente trabalhadores pobres que recebem entre dois e cinco salários mínimos. “Para se ter uma noção, em 1996, o número de contribuintes do Imposto de Renda era de aproximadamente 5 milhões. Atualmente, estamos chegando a 30 milhões de contribuintes”, diz o professor. “É um problema, tendo em vista alguns princípios constitucionais, como o da capacidade contributiva e a questão da não tributação do mínimo existencial.
Essas pessoas mais pobres, em tese, não teriam capacidade contributiva pagar Imposto de Renda”, completa
O professor ressalta que a falta de correção da tabela é um fenômeno que ocorre há algum tempo. Lembra que o Imposto de Renda no Brasil já chegou a ter mais de 10 faixas de rendimento. Hoje possui apenas quatro alíquotas.
Promessas
Em dezembro de 2019, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) voltou a dizer que pretendia elevar faixa de isenção do IR em 2020 para "próximo de R$ 2 mil". Já na época da campanha, a promessa era isentar quem ganha até R$ 5 mil. No entanto, nada saiu do papel. "Eu gostaria de entregar o meu governo, por exemplo, quem ganhasse até R$ 5 mil ficasse isento do Imposto de Renda. Estou trabalhando para que este ano a gente chegue próximo aos R$ 2 mil. O pessoal pode reclamar: ‘só R$ 2 mil, prometeu R$ 5 mil’. Eu prometi R$ 5 mil, espero cumprir até o final do meu mandato", disse o presidente no fim de 2019.
Sem obrigação
Pedro Eliezer explica que o governo federal não pode ser obrigado pelo Judiciário a corrigir a tabela. “Há posição pacífica do STF em relação ao tema desde 2011, quando foi julgado recurso extraordinário. Foi fixada a seguinte tese: "não cabe ao Judiciário realizar a correção monetária da tabela progressiva do Imposto de Renda na ausência de previsão legal nesse sentido". “O Judiciário entendeu que é a definição desse índice de correção é matéria de competência dos poderes Executivo e Legislativo, não podendo o Judiciário tomar uma função que não seria dele”, destaca. “Em um dos votos, um ministro chega a mencionar que o fato de o Executivo não fazer isso, a sanção seria a população se conscientizar e não apoiar mais aquele político numa eventual próxima eleição”. O professor lembra ainda que uma Ação Direita de Inconstitucionalidade (ADI) teve prosseguimento negado pelo ministro Luís Roberto Barroso em 2019, mantendo entendimento aplicado pelo STF desde 2011. “O Supremo continua entendendo que essa matéria não pode ser analisada, porque seria uma matéria de oportunidade e conveniência dos poderes Executivo e Legislativo.
Efeitos cascata
A falta de correção da tabela promove efeito cascata que diminui também outras deduções. Caso a tabela tivesse sido integralmente corrigida, a dedução por dependente, atualmente de R$ 189,59 por mês (R$ 2.275,08 por ano), corresponderia a R$ 387,20 por mês (R$ 4.646,40 por ano). O teto das deduções com educação, de R$ 3.561,50 em 2019, chegaria a R$ 7.260,83. Desde 2015, a tabela do Imposto de Renda não sofre alterações. De 1996 a 2014, a tabela foi corrigida em 109,63%.
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