Cotação do dia

USD/BRL
EUR/USD
USD/JPY
GBP/USD
GBP/BRL
Trigo
R$ 115,00
Soja
R$ 180,00
Milho
R$ 82,00

Tempo

Bolsonaro desafia Poderes em ato pró-intervenção e desagrada até militares

Até aliados que fazem parte do governo desaprovaram participação do presidente.

 

Bolsonaro participou de ato que pediu intervenção militar (Evaristo Sá/AFP)

 

 

O presidente Jair Bolsonaro elevou nesse domingo (19), o tom do confronto com o Congresso e o Supremo Tribunal Federal (STF) e, diante do Quartel-General do Exército, pregou o fim da "patifaria" em uma manifestação que pedia intervenção militar no país. Com microfone em punho, Bolsonaro subiu na caçamba de uma caminhonete e fez um discurso inflamado para seguidores que exibiam faixas com inscrições favoráveis a um novo AI-5, o mais duro ato da ditadura (1964 a 1985), e gritavam palavras de ordem contra o STF e o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). "Nós não queremos negociar nada. Queremos é ação pelo Brasil", disse Bolsonaro, aplaudido por centenas de manifestantes. "Chega da velha política! (…) Acabou a época da patifaria. Agora é o povo no poder." Dezenas de cartazes sugeriam fechamento do Congresso e do Supremo, além de pedidos para que as Forças Armadas ocupassem as ruas. O grito de "Fora Maia" era um dos mais ouvidos ali. Em nenhum momento, porém, o presidente contestou os apelos pela volta da repressão. A reportagem apurou que militares do governo não gostaram da atitude de Bolsonaro. O protesto foi visto como preocupante por governadores, prefeitos e pelas cúpulas do Legislativo e do Judiciário, que enxergaram no gesto de Bolsonaro o sintoma de uma escalada autoritária no país, justamente no momento em que ele perde apoio e a pandemia do coronavírus se agrava. "O mundo inteiro está unido contra o coronavírus. No Brasil, temos de lutar contra o corona e o vírus do autoritarismo", escreveu Maia, no Twitter. Para ele, defender a ditadura é o mesmo que "flertar com o caos" e estimular o desemprego. Do outro lado da Praça dos Três Poderes, o ministro do STF Luís Roberto Barroso foi na mesma linha. "É assustador ver manifestações pela volta do regime militar, após 30 anos de democracia", afirmou. Embora Bolsonaro tenha tentado passar a ideia de que o ato ocorreu de improviso, na esteira de carreatas pela reabertura do comércio, seguidores bolsonaristas convocaram as manifestações pelas redes sociais. "Dia 19-04-2020. O Brasil vai parar. 14:00 h. Na frente dos quartéis", dizia uma das convocações, em verde e amarelo, ao pregar a "deposição" do Supremo e de governadores. Além disso, mensagens de WhatsApp traziam endereços de vários quartéis e batalhões pelo país. O texto era acompanhado das hasthags #abaixo STF e #abaixo Congresso Nacional. Ao chegar no domingo ao QG do Exército, por volta de 13h30 – após almoçar na casa do deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), seu filho -, o presidente foi ovacionado por apoiadores. Apesar da recomendação da Organização Mundial da Saúde para que sejam evitadas aglomerações, com o objetivo de diminuir o risco de contágio da Covid-19, o apelo não foi respeitado. Muitos bolsonaristas chegaram ao local em carreatas, que pediam o fim do isolamento social e a reabertura do comércio. Pelo segundo dia consecutivo, Bolsonaro não poupou ataques aos outros Poderes e se empolgou com o apoio recebido. Parecia mesmo estar em um palanque de campanha. "Contem com o seu presidente para fazer tudo aquilo que for necessário para que nós possamos manter a nossa democracia e garantir aquilo que há de mais sagrado em nós, que é a nossa liberdade. Todos no Brasil têm que entender que estão submissos à vontade do povo brasileiro", discursou ele, que tossiu várias vezes durante o ato. Na prática, a ofensiva de Bolsonaro contra o Congresso, o Supremo e governadores que defendem a quarentena tem aumentado de intensidade na mesma proporção de seu isolamento político. Na rampa do Planalto, no sábado, o presidente criticou o Supremo em transmissão ao vivo pela internet e chegou até mesmo a apontar para o prédio da Corte ao lembrar que os magistrados deram autonomia a Estados e municípios para decretarem medidas de distanciamento social. "Estão fazendo o que bem entendem", disse ele, que também atacou o Congresso. "Não vão me tirar daqui", afirmou. Na noite desse domingo (19), Bolsonaro se reuniu com os ministros da Defesa, Fernando Azevedo; do Gabinete de Segurança Institucional Augusto Heleno, e da Secretaria de Governo, Luiz Eduardo Ramos, no Palácio da Alvorada. Questionado sobre o tema do encontro, Heleno foi lacônico: "Falamos sobre futebol". Também no domingo, o comandante do Exército, general Edson Pujol pregou união e classificou a pandemia como "uma das maiores crises vividas nos últimos tempos".

OAB

A participação do presidente Jair Bolsonaro em manifestações pelo fechamento do Congresso Nacional também foi criticada pelo presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz, em sua conta oficial no Twitter. "O presidente da República atravessou o Rubicão. A sorte da democracia brasileira está lançada", publicou. A expressão "atravessar o Rubicão" remete à decisão do general Júlio César, no ano 49 a.C., de afrontar o Senado romano e cruzar com tropas o Rio Rubicão, na Itália, o que era vedado pela lei da época. "Hora dos democratas se unirem, superando dificuldades e divergências, em nome do bem maior chamado LIBERDADE", seguiu o presidente da OAB, na rede social.

FHC

O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso disse em sua conta no Twitter que é "lamentável que o presidente adira a manifestações antidemocráticas". "O momento é de união ao redor da Constituição contra toda ameaça à democracia. Ideal que deve unir civis e militares; ricos e pobres. Juntos pela liberdade e pelo Brasil", disse FHC.

Gleisi Hoffmann

Presidente do Partido dos Trabalhadores (PT), a deputada federal Gleisi Hoffmann (PR) também comentou a participação do presidente Jair Bolsonaro, na tarde deste domingo, 19, em manifestações em defesa do fechamento do Congresso Nacional. Em transmissão ao vivo no Instagram com o deputado federal Zeca Dirceu (PR-PR), Gleisi disse esperar que o Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal (STF) tomem uma posição "firme" sobre o episódio deste domingo ainda nesta semana. Ao criticar o presidente, Gleisi Hoffmann afirmou que Bolsonaro aposta no caos para justificar uma intervenção militar no País. "Fiquei estarrecida. Ele quer uma ditadura no Brasil. É de uma irresponsabilidade ilimitada", declarou a presidente do PT. Gleisi, que foi ministra-chefe da Casa Civil na gestão Dilma Rousseff, ainda criticou a condução do Executivo no combate aos efeitos econômicos da pandemia do novo coronavírus. Para ela, o governo precisa estudar punição aos bancos, que estariam "empoçando o crédito" e impedindo que os estímulos cheguem a empresas e cidadãos.

Carta em apoio a Maia e Alcolumbre

Uma carta assinada por 20 governadores e divulgada neste domingo por meio do Fórum Nacional de Governadores, manifestou apoio aos presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), após ataques do presidente Jair Bolsonaro aos dois principais líderes do Congresso Nacional. Para os governadores que assinam o documento, Bolsonaro está "afrontando os princípios democráticos que fundamentam nossa Nação". A carta é assinada por todos os governadores das Regiões Sul e Nordeste. No Sudeste, só o Estado de Minas Gerais está ausente. No Centro-Oeste, a exceção foi o Distrito Federal. No Norte, não assinaram Acre, Amazonas, Rondônia e Roraima. "Neste momento em que o mundo vive uma das suas maiores crises, temos testemunhado o empenho com que os presidentes do Senado e da Câmara têm se conduzido, dedicando especial atenção às necessidades dos estados, do Distrito Federal e dos Municípios brasileiros", diz a carta. "Ambos demonstram estar cientes de que é nessas instâncias que se dá a mais dura luta contra nosso inimigo comum, o coronavírus, e onde, portanto, precisam ser concentrados os maiores esforços de socorro federativo", continua. Os governadores afirmam que não há conflitos inconciliáveis entre a salvaguarda da saúde da população e a proteção da economia nacional, ainda que os momentos para agir mais diretamente em defesa de uma e de outra possam ser distintos. "Consideramos fundamental superar nossas eventuais diferenças através do esforço do diálogo democrático e desprovido de vaidades. A saúde e a vida do povo brasileiro devem estar muito acima de interesses políticos, em especial nesse momento de crise", defendem. A carta afirma ainda que a ação dos Estados, no Distrito Federal e nos municípios tem sido pautada pelos indicativos da ciência, por orientações de profissionais da saúde e pela experiência de países que já enfrentaram etapas mais duras da pandemia, buscando, neste caso, evitar escolhas malsucedidas e seguir as exitosas. Bolsonaro abriu fogo contra Maia na última quinta-feira, após demitir o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta (DEM-MS). Em entrevista à rede de TV CNN, disse que sua atuação é "péssima" e insinuou que o parlamentar trama contra o seu governo. Em resposta, Maia afirmou que não vai atacar Bolsonaro. Horas antes da entrevista do presidente à CNN, Maia havia assinado uma nota conjunta com o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), em defesa de Mandetta, também filiado ao seu partido. No dia anterior, a Mesa Diretora da Câmara deu prazo de 30 dias para que Bolsonaro apresente à Casa o resultado dos seus exames para Covid-19. No mesmo dia, Maia reagiu às críticas. "O presidente ataca com um velho truque da política, com a demissão ele quer mudar o tema", afirmou Maia, que disse não ter intenção de prejudicar o governo. "O presidente não vai ter ataques (de minha parte). Ele joga pedras e o Parlamento vai jogar flores", completou.

Panelaço

Na cidade do Rio de Janeiro, na noite deste domingo, manifestantes protestaram contra Jair Bolsonaro. Moradores da zona sul – como de Botafogo, Laranjeiras Cosme Velho, Humaitá e Flamengo – promoveram panelaços e gritaram pedindo a saída do presidente. As manifestações têm acontecido diariamente, principalmente em resposta ao posicionamento de Bolsonaro frente à pandemia do coronavírus. Durante o protesto na capital fluminense, moradores chamaram o presidente de fascista e canalha.

 

Agência Estado/Dom Total///