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Financiadas com uma parcela milionária do fundo partidário que tem crescido a cada ano, as fundações comandadas por partidos foram criadas para investir em políticas públicas e educação política

Pela Lei dos Partidos Políticos, as siglas são obrigadas a criar uma fundação e destinar a ela pelo menos 20% do fundo partidário.

(Foto: Nelson Jr./TSE)

 

Financiadas com uma parcela milionária do fundo partidário que tem crescido a cada ano, as fundações das legendas foram criadas para investir em políticas públicas e educação política. Na prática, porém, também são usadas para contratar empresas de aliados, abrigar quem ficou sem mandato e até bancar a compra de plantas artificiais e o pagamento de jantares. A prestação de contas das fundações não segue padrão, e o dado chega a demorar mais de um ano para se tornar público, o que contribui para a realização de serviços fora do escopo das instituições. Especialistas dizem que a situação pode piorar, caso o novo código eleitoral passe a fiscalização dessas entidades para o Ministério Público. Hoje, o trabalho é feito pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que já tem expertise na análise de contas das siglas. Extratos bancários e recibos das fundações das cinco siglas com as maiores bancadas na Câmara dos Deputados foram anexados às últimas prestações de contas aprovadas pelo TSE, referentes a 2019. Naquele ano, a Fundação Indigo, do PSL, destinou R$ 10,7 mil para a compra de plantas artificiais e R$ 1,5 mil para colocar três suportes de TV.

A instalação de móveis custou mais R$ 71,3 mil. Outros R$ 64,7 mil compraram um carpete comercial. A instituição ainda realizou mais de cinco pagamentos de R$ 940 mensais para a Gerencial Brasitec, empresa do presidente da sigla, o deputado Luciano Bivar (PE). Também consta do registro de gastos a realização da Cúpula Conservadora das Américas e da Conferência de Ação Política Conservadora. Em uma das notas fiscais, há citação a “banquete”, “locação de serviços” e “restaurante Verbena”, que somam R$ 113 mil. Outros R$ 131 mil foram gastos com produção do evento. O Indigo informou que investe “em profissionais especializados, tecnologia e infraestrutura adequados”. Afirmou também que tem desenvolvido eventos, seminários e cursos que contam com mais de mil participantes. Além de atividades educacionais, a Fundação Perseu Abramo, do PT, detalhou a contratação de outros serviços, como o pagamento de quase R$ 30 mil para a empresa de Freud Godoy, ex-segurança do ex-presidente Lula. Uma das notas fiscais descreve o serviço como “segurança privada”. A fundação também pagou profissionais para escrever textos para o site O Brasil da Mudança, do Instituto Lula.

A fundação informou que a empresa de Godoy presta serviços há 19 anos. Também disse que renegociou o valor do contrato para R$ 22,6 mil. Sobre os textos para o instituto, afirmou que preservar a biografia e o legado do ex-presidente faz parte dos “objetivos estratégicos” da instituição. “Grande parte da prestação de contas dessas fundações é sem detalhamento. Encontramos diversas vezes grandes montantes direcionados para uma atividade ou serviço, mas sem a discriminação de como este recurso foi empregado”, disse Priscila Schmitz, doutoranda em Ciência Política pelo Iesp/Uerj. Outra característica comum às fundações é a presença de quadros partidários que exerciam cargos eletivos ou de confiança em órgãos de governo e ficaram sem emprego. Na Fundação Perseu Abramo, a ex-presidente Dilma Rousseff foi superintendente de relações institucionais em 2019. A entidade disse que Dilma foi contratada por sua história.

Cargo a ex-funcionário

Também foram encontrados contratos das fundações com empresas de ex-funcionários dos partidos. No Espaço Democrático, do PSD, a consultoria do ex-tesoureiro Flávio Castelli Chuery recebeu mais de R$ 500 mil em 2019 por “assessoria financeira”. Em fevereiro, Chuery foi indiciado pela Polícia Federal por propinas relacionadas à J&F. Ele nega irregularidades. Também foi contratada a empresa de advocacia de Thiago Fernandes Boverio, advogado do PSD Nacional, por R$ 39 mil ao mês. Na época, Boverio tinha cargo comissionado na Câmara. A fundação negou a intenção de abrigar aliados políticos e frisou que os profissionais possuem formação e experiência. Segundo a entidade, em 2019, foram realizados encontros regionais, além da publicação de mais de cem artigos. Advogada e membro da Comissão de Direito Eleitoral da OAB-SP, Bruna Muriel diz que a prestação de contas das fundações nada mais é do que um “processo contábil”, e que nem sempre esses gastos que fogem do escopo podem ser considerados irregulares.

“Às vezes, achamos que um gasto foge do bom senso, mas isso não significa que haja uma ilicitude. O gasto, estando dentro da legalidade, por mais que ele seja politicamente ou moralmente incorreto, continua sendo legal”, diz Bruna. Se a reforma eleitoral tirar do TSE o acompanhamento do uso dessa fatia de dinheiro público, o acompanhamento das finanças pode ficar mais difícil, diz Marcelo Issa, do Movimento Transparência Partidária. Pela Lei dos Partidos Políticos, as siglas são obrigadas a criar uma fundação e destinar a ela pelo menos 20% do fundo partidário. Apesar disso, algumas siglas pegam de volta parte da verba. O Instituto Valle, do PL, recebeu R$ 600 mil em 2019 e retornou ao partido R$ 9,4 milhões. Já o PP repassou R$ 10,5 milhões à Fundação Milton Campos e devolveu R$ 5 milhões à legenda. À reportagem, os dois partidos disseram que a prática está prevista na legislação.

 

 

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