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Documentário conta a histórica luta para aprovação das cotas na UFRGS

Modelo de ingresso que “mudou a cara” da universidade está completando 15 anos em vigor

*Por Luciano Velleda (Sul 21) – [email protected]

Lançamento do documentário “Cotas: uma porta aberta“, na Sala Redenção da UFRGS. Foto: Luiza Castro/Sul21

Quando o filme chegou ao final, cerca de 200 pessoas aplaudiram de pé o documentário curta-metragem “Cotas: uma porta aberta”, exibido pela primeira vez na última quarta-feira (29), na Sala Redenção da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). A data não foi escolhida por acaso: o dia 29 de junho deste ano marcou os 15 anos de implementação da aprovação de cotas com recorte social e racial na UFRGS.

Com roteiro e direção do jornalista Douglas Roehrs e apresentação de Tamyres Filgueira, coordenadora-adjunta do Núcleo de Estudos Africanos, Afro-brasileiros e Indígenas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Neabi-UFRGS), o documentário entrevista negros e indígenas que tiveram ligação com a histórica conquista, seja na luta pela sua implementação na universidade ou como beneficiados da política. Com 37 minutos de duração, a obra entrevista personagens como o escritor Jeferson Tenório, o senador Paulo Paim (PT), a deputada federal Vivi Reis (Psol-PA), o professor José Rivair Macedo, entre outros.

Tamyres explica que a ideia do filme nasceu da percepção de que não havia registros da mobilização e organização dos 15 anos das cotas na UFRGS, principalmente pelo olhar dos seus protagonistas. “É um importante resgate para a memória da luta pelas cotas aqui na universidade. O objetivo maior do documentário foi tentar reunir alguns arquivos, documentos e depoimentos que pudessem resgatar essa memória que é tão importante porque teve um impacto muito grande em transformar a cara da universidade, que começou a incorporar setores que historicamente eram alijados desse espaço”, explica.

A coordenadora-adjunta do Neabi destaca que as mudanças provocadas pela implementação das cotas podem ser vistas no dia a dia de uma universidade “mais colorida”, com novos saberes trazidos pelos estudantes cotistas. “Esses conhecimentos não estavam nos livros, eles estão justamente na vivência, na experiência dessas pessoas que trouxeram para dentro da universidade um olhar e uma perspectiva diferente. Com certeza esse dia 29 de junho é uma data que tem que ser celebrada todo ano para a gente nunca esquecer do quanto é importante manter as cotas dentro da universidade”, afirma a servidora pública.

Uma das personagens do documentário, Vera Rossani, servidora aposentada da UFRGS, lembrou que nos dias que antecederam a reunião do Conselho Universitário em que seria debatida a aprovação das cotas, os muros da Faculdade de Direito exibiam pichações com a frase: “Lugar de negro é na cozinha do RU (restaurante universitário)”.

“Essa é a história. Conseguimos botar o pé na porta e estar aqui hoje. Só que isso não basta”, salientou. Ex-diretora da Casa do Estudante, Vera também recordou as dificuldades dos alunos indígenas e mulheres em se manter na universidade e se emocionou ao ver hoje a conquista dos indígenas com uma casa do estudante própria. “Entrar foi muito difícil e permanecer é muito mais. Mas vamos vencer e fazer com que tenha cotas também no mestrado e no doutorado”, projetou a servidora aposentada.

Formada em Ciências Sociais, Reginete Bispo entrou na UFRGS em 1990 e recordou ter sido exceção como aluna negra da instituição naqueles anos. Para ela, ver a diversidade dos estudantes atualmente é “fenomenal”. “A política de cotas democratizou as relações de poder no Brasil”, analisa.

Suplente do senador Paim, ela destacou as forças existentes no Congresso Nacional contra a Lei de Cotas. Ao complementar 10 anos de sua promulgação, a lei prevê que ela seja avaliada novamente. O debate, entretanto, pode ficar para 2023, para depois das eleições e com um novo Congresso. Porém já existem projetos para revogar o modelo de ingresso no ensino superior.

“A luta é longa. Nossos passos vêm de longe. Estamos democratizando a universidade e vamos democratizar esse País”, projetou.

Da esquerda para a direita: Alan Alves Brito, coordenador do Neabi; Vera Rossani; e Tamyres Filgueira, coordenadora-adjunta do Neabi. Foto: Luiza Castro/Sul21

Pós-graduação

Conforme se encaminha para o final, o filme “Cotas: uma porta aberta” projeta a próxima luta dentro da UFRGS: a aprovação do modelo de ingresso nos cursos de pós-graduação.

Atualmente, alguns programas de pós-graduação na universidade já proporcionam o ingresso por meio de cotas, mas outros não. Cada programa tem autonomia para decidir se quer ou não o modelo, o que faz com que a UFRGS, institucionalmente, não tenha uniformidade no tema.

Para incidir no assunto, durante a exibição do filme foi lançada campanha em defesa de uma normativa para regulamentar as cotas em todos os cursos da pós-graduação da UFRGS.

“Hoje tem certos programas que são resistentes e que não acataram esse processo de reserva de vagas, então a campanha vem no sentido de fortalecer essa pauta e garantir o acesso dos estudantes cotistas, para que consigam continuar a sua formação e se especializar”, explica Tamyres.

Além de propiciar a sequência dos estudos para os estudantes cotistas que se formam na graduação, ela ressalta que as cotas na pós-graduação irão impactar, no futuro, no próprio corpo docente da universidade, considerando que para se tornar professor universitário é fundamental ter mestrado e, normalmente, doutorado. Até 2019, menos de 1% dos professores da UFRGS eram negros e não havia nenhum indígena no corpo docente.

“A gente quer fazer com que essa mudança aconteça. E para isso a gente sabe que existe algo que é chave para ter essa transformação, que é garantir o acesso dos estudantes cotista também na pós-graduação”, afirma a coordenadora-adjunta do Neabi.

O documentário em breve deve ser disponibilizado em alguma plataforma de vídeo. Antes disso, a perspectiva dos realizadores é fazer outras exibições em cursos da graduação e da pós-graduação.

Fonte: Sul 21