Procuradoria destacou papel da emissora na tentativa de golpe de Bolsonaro e pediu ainda multa de R$ 13,4 milhões

O Ministério Público Federal (MPF) apresentou suas alegações finais na ação civil pública ajuizada em 2023 contra a Jovem Pan e pediu o cancelamento de suas três outorgas de rádio. Para o MPF, a emissora cometeu abusos graves, ao longo de 2022, ao sistematicamente desinformar seus ouvintes e veicular conteúdos que colocaram em risco o regime democrático brasileiro. O documento foi protocolado nesta segunda-feira (15), quando se encerra o prazo concedido pela Justiça Federal para as considerações conclusivas das partes. Esta é a última etapa da tramitação processual antes do julgamento em primeira instância.
Nas alegações finais, o MPF também manteve os demais pedidos formulados inicialmente na ação, entre eles a condenação da Jovem Pan ao pagamento de R$ 13,4 milhões como indenização por danos morais coletivos. Durante o andamento processual, as partes chegaram a entabular negociações, por solicitação da emissora, na busca de uma solução consensual que previsse medidas alternativas às pleiteadas na ação. Porém, sem vislumbrar a viabilidade de um acordo, o MPF pediu à Justiça que a tramitação fosse retomada.
O MPF destaca que os fundamentos para a condenação da Jovem Pan tornaram-se ainda mais fortes após a descoberta dos meandros da trama golpista contra o Estado Democrático de Direito, que se desenrolou de 2021 a 2023. As investigações reuniram um farto volume de provas da conspiração e culminaram na apresentação de denúncias detalhadas pela Procuradoria-Geral da República (PGR) contra integrantes de diferentes núcleos envolvidos nos planos. Na última quinta-feira (11), o Supremo Tribunal Federal (STF) condenou oito réus que constituíam o grupo coordenador das ações criminosas.
Campanha de desinformação
A Jovem Pan, ressalta o MPF, teve papel fundamental na campanha de desinformação empreendida em 2022 para desacreditar as instituições nacionais e o processo eleitoral brasileiro, induzindo uma enorme quantidade de ouvintes em todo o país a duvidar da lisura das eleições realizadas naquele ano. A veiculação sistemática, pela emissora, de informações falsas, acompanhadas de incitações reiteradas à desordem e à intervenção das Forças Armadas sobre os Poderes constituídos, foi um dos componentes essenciais para o clima de insurreição que os golpistas pretendiam instaurar. De acordo com o MPF, a Jovem Pan foi “a principal caixa de ressonância, na esfera pública brasileira, para discursos que pavimentavam as ações golpistas que vieram a ser desveladas, dando-lhes uma aparência indevida de suposta legitimidade”.
Os apelos de comentaristas da Jovem Pan à ruptura institucional baseada em intervenção militar, à destituição e até mesmo à prisão de autoridades e à desobediência a ordens judiciais tornaram-se recorrentes no período e caracterizaram a própria linha editorial da emissora. O MPF lembra que os conteúdos, desprovidos de base factual ou jurídica, contribuíram diretamente para estimular o radicalismo traduzido em episódios de extrema violência e vandalismo, como o ataque às sedes dos três Poderes, em Brasília (DF), em 8 de janeiro de 2023.
A Constituição e as leis sobre o serviço público de transmissão em rádio e TV proíbem expressamente as condutas adotadas pela Jovem Pan enquanto detentora de outorgas. Incentivar a desobediência, veicular notícias falsas com perigo para a ordem pública, econômica e social e insuflar a rebeldia ou a indisciplina nas Forças Armadas, por exemplo, são atos que o Código Brasileiro de Telecomunicações (Lei 4.117/1962) classifica como abusos no exercício da liberdade de radiodifusão. Todas essas ações extrapolam os limites constitucionais e legais da livre expressão do pensamento e, conforme a legislação, podem motivar o cancelamento de outorgas.
“A imposição judicial de medidas severas à Jovem Pan, proporcionais à gravidade dos fatos apurados, é fundamental para, traçando uma linha no chão, firmar que condutas como as praticadas pela emissora ora demandada são juridicamente inaceitáveis, e para que, atribuídos os ônus cabíveis, outras condutas análogas a elas não se repitam no futuro. Disso depende a garantia de que a comunicação pública brasileira nunca mais se ponha a serviço de aventuras antidemocráticas”, asseverou o procurador regional dos Direitos do Cidadão adjunto em São Paulo, Yuri Corrêa da Luz, titular da ação do MPF.
O número da ação é 5019210-57.2023.4.03.6100. A tramitação pode ser consultada em https://pje1g.trf3.jus.br/pje/ConsultaPublica/listView.seam.
Leia a íntegra das alegações finais do MPF
Fonte: Ministério Público Federal (MPF) / Assessoria de Comunicação em São Paulo