Realizado pelo Nonada, pelo Instituto Sapaciência e o Coletivo Jovem Tapajônico, a iniciativa é um arquivo multimídia de histórias e relatos de pessoas afetadas por eventos climáticos

As mudanças no clima estão transformando vidas. Enchentes históricas, secas, calor extremo, queimadas e deslizamentos atingem comunidades inteiras — e muitas vezes os impactos ficam registrados apenas em números. No próximo dia 16, o Instituto Sapaciência, o Nonada e o Coletivo Jovem Tapajônico lançam no Espaço Ecoamazônias, em Belém (PA), o projeto Biblioteca das Histórias Climáticas, uma iniciativa que busca olhar para o impacto humano da crise climática. A plataforma já está disponível online e consiste em arquivo multimídia e digital que coletará histórias e relatos de pessoas atingidas pelo clima no Sul Global.
Além da biblioteca, o projeto lança uma cartilha com orientações didáticas para o registro de histórias relacionadas a perdas e danos causados pela crise. O guia, disponível em português, inglês e espanhol, foi pensado como uma ferramenta de escuta sobre os impactos de eventos extremos. Tanto a Biblioteca como a Cartilha, tem como principal objetivo a valorização e escuta da memória, entendendo que as memórias climáticas não são apenas individuais, mas podem ser essenciais na construção de políticas públicas e no fortalecimento de redes.
O guia contempla orientações práticas para a escuta, como roteiro de perguntas, tópicos a serem abordados, formatos possíveis de captação, limites éticos do trabalho e sugestões de veiculação. A proposta é que a cartilha possa auxiliar comunidades, e ao mesmo tempo sirva como base para pesquisas, ações comunitárias e políticas públicas mais justas.
Os relatos coletados podem estar relacionados a diferentes abordagens sobre o clima, como perdas pessoais, ações de resistência, soluções locais encontradas ou mudanças na forma de viver decorrente da crise climática. Pessoas localizadas em territórios do chamado Sul Global podem inscrever seus relatos através de diferentes maneiras: por meio de entrevistas, cartas, vídeos, áudios, fotografias, desenhos ou diários. Já a publicação traz dicas para o público também pode construir sua própria biblioteca virtual de histórias climáticas.
Na plataforma, as histórias estão organizadas em cinco categorias diferentes, relacionadas ao território: comunidades ribeirinhas, periferias urbanas, reservas extrativistas, territórios quilombolas e territórios originários. Já no lançamento, a Biblioteca conta com mais de dez relatos de diferentes partes do Brasil, como Acre, Pará e Mato Grosso.
A ativista Gleiciane de Oliveira, agente cultural radicada em Rio Branco, no Acre, contou em vídeo que a sua vida e a da família nunca mais foram as mesmas depois da enchente histórica que acometeu a capital do Acre em 2015. Moradora da Baixada do Sobral, região periférica da Amazônia Brasileira, ela relata . “A nossa casa alaga todos os anos desde então. Nós temos que levantar os móveis e também deixar a nossa casa para acampamentos temporário”, conta. “É uma situação muito caótica, porque ninguém nunca quer deixar sua casa de forma forçada por causa dos alagamentos. Isso é como a crise climática vem afetando o meu território na Amazônia.”
Outro relato já disponível na Biblioteca é o da ativista Andrea Ixchíu, moradora de Totonicapán, na Guatemala. “Desde que sou criança e tenho memória, aprendi que a terra, os bosques são nossos avós, nossos irmãos maiores. Tem que sempre pedir licença para interagir com eles”, conta em seu relato. Na Biblioteca, ela conta que seu povo maia lhe ensinou a respeitar o tempo da terra, ao mesmo tempo que vivenciou na pele a violência contra os povos indígenas de seu território. “Desde então, comecei a me organizar para limpar os bosques, os rios, para evitar que esse modelo capitalista que nos separa da terra termine com a gente.”
A iniciativa tem apoio da UMI Fund e foi desenvolvida ao longo de um ano, como parte da rede Sul x South, animada pelo Instituto Procomum, em agosto do ano passado em Santos (SP). O Nonada foi uma das 36 organizações, originárias de 15 países, que integrou o evento.
Fonte: Nonada Jornalismo





