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Mudança no protocolo sobre a cloroquina se torna alvo de impasse e disputa

Sociedade de Imunologia diz que é ‘precoce’ o uso como deseja o presidente Bolsonaro.

 

 

Pesquisas científicas negam a eficácia do medicamento, mas presidente insiste em adotá-lo (Joe Klamar/AFP)

 

 

O uso da cloroquina e da hidroxicloroquina no tratamento da Covid-19 continua sendo alvo de disputa política e está no centro dos debates sobre a sucessão no Ministério da Saúde, já que foi um dos motivos para a saída de dois ex-ministros do cargo: Luiz Henrique Mandetta e Nelson Teich. O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) se agarra à medida e quer alterar o protocolo para administração em pacientes vítimas do coronavírus, algo que tem sido contestado pela comunidade científica e requer acompanhamento médico devido aos efeitos colaterais. Nesta segunda-feira (18), a Sociedade Brasileira de Imunologia (SBI) divulgou um parecer científico contrário ao uso neste momento, aumentando a polêmica sobre o tema.

No Planalto, assessores estudam se Bolsonaro vai mudar o protocolo antes da nomeação do novo ministro, o que teria que ser feito com concordância do atual interino da Saúde, o general Eduardo Pazuello. De acordo com o blog da jornalista Andreia Sadi, militares e parlamentares resistem à ideia de Pazuello assinar a alteração no protocolo e possivelmente desgastar a imagem das Forças Armadas. Por outro lado, nenhum médico ou futuro ministro, como era o caso dos exonerados por Bolsonaro, quer se responsabilizar por uma medida. No caso de um médico assinar, ele poderia ter que responder junto ao Conselho de Medicina. No parecer divulgado, a SBI o comitê científico e a diretoria da entidade afirmam que é "precoce" recomendar os dois medicamentos para pacientes do novo coronavírus, pois "diferentes estudos mostram não haver benefícios" e pelos possíveis efeitos adversos graves.

"A SBI fortemente recomenda que sejam aguardados os resultados dos estudos randomizados multicêntricos em andamento, incluindo o estudo coordenado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), para obter uma melhor conclusão quanto à real eficácia da hidroxicloroquina e suas associações para o tratamento da Covid-19", diz o parecer. A entidade ressalta que são necessários estudos com maior abrangência amostral e feitos de forma randômica (em que os pacientes são escolhidos aleatoriamente e apenas metade recebe o tratamento, a fim de comparação). "A escolha desta terapia, ou mesmo a conotação que a Covid-19 é uma doença de fácil tratamento, vem na contramão de toda a experiência mundial e científica com esta pandemia."

Perigo

O parecer científico diz, ainda, que o posicionamento em defesa do amplo uso da cloroquina e da hidroxicloroquina no tratamento da Covid-19 é "perigoso" e "tomou um aspecto político inesperado". "Nenhum cientista é contra qualquer tipo de tratamento, somos todos a favor de encontrar o melhor tratamento possível, mas sempre com bases em evidências científicas sólidas." O texto foi divulgado após o comitê científico da SBI analisar os estudos sobre os efeitos dos dois medicamentos para a Covid-19.

Ele lembra, por exemplo, que uma das primeiras pesquisas com essa proposta terapêutica – que envolvia o uso associado da hidroxicloroquina à azitromicina – era focada em 36 pacientes, o que seria uma "amostragem pequena e sem grupo de controle para comprovar qualquer resultado definitivo". Além disso, são lembrados outros estudos mais abrangentes, como um que avaliou 1.438 casos confirmados da doença em 25 hospitais divididos em quatro grupos de tratamento. Nessa pesquisa, foi identificada uma "maior incidência de falência cardíaca" entre as pessoas que tomaram hidroxicloroquina e azitromicina, além de não ter sido identifica "nenhuma melhora significativa quanto à mortalidade" entre aqueles que receberam os dois fármacos associados ou separadamente.

Outro estudo destacado pelo parecer avaliou 1.376 pacientes, mas também não identificou diferenças entre os dois grupos (divididos entre os que tiveram e os que não tiveram acesso à hidroxicloroquina). "Entretanto os autores ressaltam que estudos randomizados são necessários para uma melhor conclusão quanto a eficácia dessa terapia", ressalta o texto. Além disso, a entidade lembra de estudos voltados a pacientes em estado moderado da doença. Um deles envolveu 150 pacientes, divididos em grupos que tomaram e não tomaram hidroxicloroquina, que não tiverem diferença quanto à evolução da covid-19, embora parte tenha enfrentado efeitos adversos do fármaco. Situação semelhante se repetiu em uma pesquisa com 90 pacientes.

Investimentos

O parecer também ressalta a necessidade de investimento em pesquisas que procuram outras possibilidades terapêuticas e que, até o momento, o isolamento social é a melhor forma de conter a disseminação da doença. "Dados colhidos em vários países do mundo mostram que esta é a única medida efetiva para desacelerar as curvas de crescimento dessa infecção." "A avaliação de possíveis novas terapias, assim como o reposicionamento de fármacos, têm sido alvo de intensa investigação científica, sendo uma das principais prioridades da comunidade científica mundial.

Entretanto, deve ser ressaltado que até o momento não foi descrita nenhuma terapia efetiva para o tratamento da covid-19 que tenha bases sólidas com resultados cientificamente comprovados." A entidade ainda cita o recente editorial da revista médica Lancet, que diz que o presidente Jair Bolsonaro é a principal ameaça ao combate à pandemia do novo coronavírus no Brasil. "Reforçamos que o engajamento da sociedade brasileira é fundamental para superar a grande crise sanitária que estamos vivendo e que a condução para as soluções devem ser fundamentadas em bases científicas multidisciplinares sólidas, como uma política de Estado.

" O parecer científico é assinado pelos 17 integrantes do comitê científico e pelos cinco diretores da SBI, presidida pelo cientista Ricardo Gazzinelli, pesquisador da Fiocruz e professor da UFMG. Os medicamentos, usados originalmente contra malária e lúpus, foram aplicados no começo da pandemia em alguns poucos pacientes na China com resultado promissor, foram defendidos por um controverso cientista francês e pelos presidentes Donald Trump (que mudou de posicionamento posteriormente) e Jair Bolsonaro.

 

 

Dom Total/Agência Estado///