A grande questão é perceber que o uso desenfreado desses produtos químicos pode gerar consequências nefastas para todas as formas de vida humana.
Dentro da sociedade de risco atual, a justiça ambiental aparece como importante instrumento de interferência na relação homem e natureza. (Pixabay)
São várias as definições de agrotóxicos. Para o Ministério da Fazenda os agrotóxicos são substâncias químicas, físicas ou biológicas utilizadas na agricultura com o objetivo de alterar a composição química tanto da flora quanto da fauna a fim de preservá-las. Outra definição importante é elaborada pela OMC (Organização Mundial de Saúde) quando define agrotóxico como toda substância capaz de controlar uma praga sem oferecer riscos a população e ao meio ambiente. Portanto, extrai-se desta última definição que tais substâncias foram criadas para serem letais para as pragas alvos, e não para a vida humana. A grande questão é perceber que o uso desenfreado desses produtos químicos pode gerar consequências nefastas para todas as formas de vida humana.
Sobre a questão urge citar a publicação do Ato nº 24 no último dia 10 de Abril de 2019, no Diário Oficial da União. Tal ato autorizou a liberação de mais 31 agrotóxicos, totalizando 152 somente este ano. Dos 31 produtos liberados, 16 são classificados como “extremamente tóxicos”, ou seja, mais da metade da nova listagem. Acima de qualquer benefício que o homem possa obter dos agrotóxicos, como o incremento da produção e redução da fome, tais produtos devem ser analisados sobre o viés do custo-benefício, ou seja, os princípios da precaução e da proporcionalidade.
Originalmente, o princípio da precaução teve sua origem na Grécia quando era concebido como corolário da ética. Somente em 1970 foi consolidado na Alemanha, mas logo ganhou destaque em outros países europeus. No Brasil, foi proposto na Declaração do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável – Rio/92 enumerado como princípio 15 “"a garantia contra os riscos potenciais que, de acordo com o estado atual do conhecimento, não podem ser ainda identificados". O princípio assevera que “para que o ambiente seja protegido, serão aplicadas pelos Estados, de acordo com as suas capacidades, medidas preventivas. Onde existam ameaças de riscos sérios ou irreversíveis, não será utilizada a falta de certeza científica total como razão para o adiamento de medidas eficazes, em termos de custo, para evitar a degradação ambiental".
A PAN – Pestice Action Network, organização mundial de ação contra os agrotóxicos, defende que o princípio da precaução será aplicado quando as provas científicas forem inconclusivas, mas que uma avaliação preliminar aponte que hajam riscos para a saúde humana, animal ou vegetal caso se utilize determinado agrotóxico. Tal Organização Internacional exige a aplicação do princípio de precaução nas políticas nacionais e mecanismos reguladores internacionais de pesticidas: Devem ser tomadas medidas preventivas precoces para eliminar os pesticidas nocivos, incluindo os persistentes, acumulativas ou altamente tóxicas, como as da classe Ia e Ib da OMS e aqueles que causam ou são suspeitos de causar efeitos crônicos na saúde, incluindo câncer, problemas reprodutivos, defeitos congênitos, impactos de desenvolvimento e comportamentais, e efeitos sobre os sistemas imunológico, endócrino e neurológico; substituição de pesticidas nocivos por alternativas menos nocivas, incluindo métodos ecológicos e abordagens holísticas para controlar pragas, ervas daninhas e doenças; regulamento com base nos grupos mais vulneráveis afetados, por exemplo mulheres grávidas, o feto e o recém-nascido; um conjunto de dados completo, incluindo efeitos a longo prazo antes de os pesticidas serem meio Ambiente; reconhecimento das experiências de trabalhadores e comunidades em relação a efeitos de pesticidas; o direito de quem usa ou se expõe a pesticidas para saber o que é que eles são expostos, e as propriedades perigosas do pesticida; o direito da participação popular na tomada de decisões em relação à regulamentação de pesticidas, incluindo participação ativa em comitês nacionais de agrotóxico.
Sendo assim, nas questões afetas ao uso de agrotóxicos deve-se considerar sob a perspectiva do princípio da precaução a avaliação do risco do uso (segurança, níveis de contaminação e ate mesmo formas alternativas para a atividade). Em suma, evitar perigos que causem danos ao meio ambiente.
A utilização dos agrotóxicos deve ser também proporcional. O princípio da proporcionalidade, derivado do postulado da precaução, vem ganhado cada vez mais destaque no âmbito das questões ambientais. Sob a égide da proteção ambiental, as práticas que interferem no meio ambiente devem ser pautadas pela adequação, necessidade e pela própria proporcionalidade. Qualquer tipo de desproporção negativa, evidenciada pelo uso exacerbado de agrotóxicos, por exemplo, evidencia uma flagrante ofensa aos preceitos da Justiça Ambiental.
Dentro da sociedade de risco atual, a justiça ambiental aparece como importante instrumento de interferência na relação homem e natureza. Ela deve estar presente na solução dos conflitos ambientais em suas diversas vertentes ecológicas, sociais, econômicas e éticas. A justiça ambiental propõe um Estado Socioambiental, mais sustentável e mais solidário.
Como dito, há flagrante ofensa aos princípios da justiça ambiental, uma vez que o ônus recai de maneira desigual sobre os mais vulneráveis restringindo o acesso dos alimentos às populações mais carentes. Não obstante, não se ignora o fato de que nos países em desenvolvimento faz-se necessário o uso de agrotóxicos para manter longe os quadros de fome. Então, acredita-se na utilização razoável, no risco sopesado do uso. Ademais, a praticas de saúde como a prevenção de efeitos nocivos a saúde beneficia a coletividade sendo esta, portanto, uma forma de desenvolvimento sustentável.
Por todo exposto, dentro das questões afetas a justiça fiscal, espera-se que o legislador faça a substituição progressiva dos agrotóxicos mais perigosos pelos que contem menor toxicidade minimizando qualquer risco às populações e ao meio ambiente.
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