Luís Eduardo Gomes, Sul 21 – Aprovada em 2014 na Assembleia Legislativa (AL), o regime especial de aposentadoria dos deputados gaúchos voltou a ser tema de debate na semana passada com a divulgação do parecer do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, sobre a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 5302) ajuizada pela seccional gaúcha da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-RS). De acordo Janot, o plano de seguridade dos parlamentares fere os princípios da moralidade previstos na Constituição.
A OAB ajuizou a ação em abril de 2015 para questionar a constitucionalidade do regime de aposentadoria, plano de adesão voluntária que permite que deputados com 35 anos de mandato eletivo possam receber seus vencimentos na íntegra. Anteriormente, suas aposentadorias estavam limitadas ao teto do INSS – que deve ir para R$ 5,2 mil neste ano.
Para receber o salário na íntegra ou parcialmente, os deputados precisam aumentar a contribuição, o que também aumenta o percentual da própria AL, onerando os cofres públicos (entenda melhor abaixo). O valor de contribuição da AL para aposentadoria dos parlamentares subiu de 20% para 26,5% do total do subsídio. Na prática, isso significa que o aumento de gastos para os cofres públicos foi o equivalente a 6,5% do salário de cada deputado. Segundo o site Consultor Jurídico, a estimativa é que a aposentadoria especial dos parlamentares custe quase R$ 5 milhões por ano aos cofres públicos.
Em seu parecer, divulgado no último dia 19, Janot afirma que o plano de seguridade social da AL gaúcha viola princípios da Consituição Federal e patrocina “grave instituição de privilégios e tratamento desigual sem base racional para tanto”.
“O princípio republicano e o da igualdade exigem que, ao final do exercício de cargo eletivo, seus ex-ocupantes sejam tratados como os demais cidadãos, sem que haja razão para benefícios decorrentes de situação pretérita”, diz o parecer de Janot. Ele ainda afirma que “é uma ofensa aos princípios republicanos (artigo 1º) da impessoalidade e da moralidade (artigo 37, caput), por ter a lei instituído privilégio e tratamento desigual, com previsão de requisitos e critérios diferenciados para aposentadoria de parlamentares”.
Na visão da Advocacia-Geral da União, que também emitiu parecer na ação, os deputados estaduais não têm direito a um regime próprio de aposentadoria, pois isto seria assegurado apena aos servidores públicos titulares de cargos efetivos.
Por sua vez, Ricardo Breier, presidente recém-empossado da OAB-RS, diz que não é competência do Estado legislar sobre o regime da Previdência Social e que a lei gaúcha também é um desrespeito à cidadania. “Ser político é um ato transitório. O exercício da atividade parlamentar não é carreira de Estado. É atividade de doação, não sendo profissionalizada. Portanto, esse benefício representa uma afronta e um desrespeito ao princípio de igualdade frente ao cidadão gaúcho”, afirma Breier.
Por outro lado, o procurador-geral da AL, Fernando Guimarães Ferreira, sustenta a manutenção do regime de aposentadoria especial em virtude do plano da AL ser idêntico a um aprovado pelo Congresso Nacional. Segundo ele, o Supremo Tribunal de Justiça (STJ) e o Supremo Tribunal Federal (STF) já apreciaram indiretamente a questão em ações relacionadas ao plano do Congresso e nunca apontaram irregularidades. “O TCU também entendeu que é regular o plano de previdência do Congresso e o nosso do Estado é igual”, diz. “O que nos deixa tranquilos é que não criamos nada que já não existisse há pelo menos quase 20 anos no País”, complementa.
Ferreira também afirma que a Constituição em nenhum momento determina que parlamentares devem obrigatoriamente ser contribuintes do INSS, mas que isto está posto em uma lei federal posterior, portanto não caberia uma ação direta de inconstitucionalidade.
“A mesma lei federal diz que os detentores do mandato eletivo são contribuintes obrigatórios do INSS, salvo aqueles vinculados a regime próprio de previdência. Nessa mesma lei federal de 1997, criou-se o plano de seguridade do Congresso”, diz. “Não fica em dúvida que eles entederam, quando criaram lá atrás, que o plano de seguridade social de Congresso é um regime próprio de previdência. Vale o mesmo para o RS, porque o principio é o mesmo”.
Aprovado por ampla maioria
A aposentadoria especial, projeto encaminhado pela mesa diretora, foi aprovado em novembro de 2014, por 29 votos a favor e 14 contrários – votaram contra os 12 deputados do PT na legislatura passada, Jorge Pozzobom (PSDB) e Vinicius Ribeiro (PDT).
Na ocasião, o ex-deputado Raul Pont (PT) criticou a proposta em plenário. “Do nosso ponto de vista, esse projeto é inoportuno e equivocado”, afirmou o parlamentar na época, acrescentando que a proposta “privilegia” uma pequena parcela da sociedade. Ele defendia o fortalecimento do Regime Geral de Previdência e o “interesse comum dos trabalhadores”, alegendao que os deputados que quisessem ganhar melhores aposentadorias deveriam fazer um plano complementar.
Por outro lado, ao apresentar a proposta, o então presidente da Assembleia, deputado Gilmar Sossella (PDT), afirmou ela “era um compromisso” de sua gestão e salientou que só deputados com nove anos de mandatos teriam o direito à aposentadoria integral.
Entenda a aposentadoria especial:
– Desde 1997, os deputados eram submetidos ao Regime Geral da Previdência, como a maioria dos trabalhadores, e se aposentavam de acordo com essa regra. Ou seja, recebiam uma aposentadoria equivalente aoteto do Regime Geral da Previdência.
– Pelo Regime Geral, a Assembleia Legislativa contribui com 20% sobre o subsídio total do deputado e os parlamentares contribuem com 11% do teto. A partir do novo plano, a AL passa a contribuir com 26,5% do subsídio e os deputados com 13,25 de seu vencimento total, não mais limitado ao teto.
– Os deputados podem ter direito à aposentadoria integral com 35 anos de exercício do mandato e 60 anos de idade. Para o exercício de mandato, podem contar as atividades como vereador, deputado federal, por exemplo. Para isso, o parlamentar terá de averbar esse tempo e depositar as contribuições referentes a esse período;
– O plano admite aposentadoria proporcional, em caso de não atender os critérios para receber o benefício integral;
– Pelo plano, os deputados podem receber salários mais elevados em relação ao teto do Regime Geral da Previdência, uma vez que o valor será calculado com base nos subsídios dos parlamentares, correspondendo a 1/35 por ano de exercício de mandato;
– Também os dependentes podem receber pensões em caso de morte do deputado;
– Os parlamentares podem optar ou não pelo Plano de Seguridade Social;